DESFECHO: Acompanhe o meu processo de criação da escrita do livro "O ERMITÃO"












        


                                                          Vem comigo.


                           Uma viagem no meu processo de escrita do livro.



                                   " O ERMITÃO"


                                                    Dedicatória:

                   Dedico este livro ao meu avô Vitalino Gomes da Silva, que em vida soube apreciar a arte da literatura e através de sua contação  de  histórias fazia das nossas noites, um grande momento de magia como se estivéssemos viajando em um grande trem através das belas paisagens do realismo fantástico.

Saudades da minha infância e da sua existência, meu eterno avô.


                                                    Apresentação.


              Em uma cidadezinha pacata que fica situada entre montanhas de uma país conhecido,  um jovem muito querido por todo o povo do vilarejo, desaparece misteriosamente no dia que seria o mais feliz de sua vida, dia do seu casamento. A partir deste dia, a cidade não é mais a mesma, alguns fenômenos estranhos passam a acontecer causando muita especulação , muito estranhamento e muito suspense. Você está convocado para desvendar junto comigo, o enigma de " O ERMITÃO"

Vem comigo! 

O jovem eremita 
 
Um jovem em busca da verdade 
Resolveu deixar a cidade 
E partir para as montanhas 
Em busca de novas façanhas 
 
E ali, no alto das pedras 
Encontrou as cavernas 
Um lugar solitário e sombrio 
Que ele achou tão desejável 
 
Decidiu então ficar lá sozinho 
Sem a companhia de mais nenhum humano 
Pensou que ali encontraria a paz 
E que nunca mais teria que se preocupar 
 
Mas a solidão é um fardo pesado 
Que o jovem eremita carregava 
E apesar da beleza natural 
Aos poucos a dor se intensificava 
 
Mas ele não podia voltar atrás 
Havia tomado sua decisão 
E ali permaneceria até o fim 
Como um eremita sem razão 
 
O tempo passou e o jovem envelheceu 
E com ele a sabedoria cresceu 
Aprendeu a conhecer a si mesmo 
E a amar o mundo inteiro 
 
E ao final de sua jornada 
O jovem eremita entregou sua alma 
Sabendo que havia encontrado a verdade 
Na solidão que tanto o amedrontava. 


                                                               PRÓLOGO

          

                                      

                          Era uma vez,em  uma cidadezinha misteriosa. 

 

                Situada em uma região montanhosa em meio a um grande vale e cercada da  mata atlântica também de  algumas fazendas de café e também de criação de gado, eis que está Vulcânia, nome dado devido a presençã de um vulcão adormecido que estava coberto pela mata, porém sua cratera era visível e consta que por lá havia muitas fontes de águas quentes. Ficava  em uma  área de preservação ambiental e  também um patrimônio histórico e cultural brasileiro.

 A origem desta cidadezinha vem  dos tempos da colonização e foi fundada pelos bandeirantes, tropeiros e aventureiros que alí se instalavam para o descanso em uma antiga estrebaria, hoje uma grande pousada, a Casa do Sol Nascente. Entre os diversos mitos e lendas que vinham da a imaginação daqueles moradores simples, um era a presença constante na praça da cidade do” Pai da mata”, “Velho do sacolão” Profeta lá do fundão” , estes eram os nomes que eram dados para um antigo morador das grutas do outro lado das montanhas, lugar que ninguém ousava visitar pois diziam que lá era mal assombrado.  Quem se arriscava desbravar a região das cavernas, jamais voltava . Era jogado na cratera de um vulcão fumegante, mais quente  o fogo dos infernos de acordo com segundo a lenda.

 

Mas o velho existia de verdade,aparecia sempre  com barbas longas e grisalhas , cabelos compridos todos embaraçados, sempre com um velho cajado. Vestia-se  com uma  velha e surrada túnica franciscana com cordão esfarrapado na cintura e pés calejados e as vezes trazia nos pés uma velha alpercata de couro. O  povo ia escutar suas histórias,  profecias, conselhos e até a previsão do tempo que muitas vezes acertava.

Na verdade, o pobre homem era um ermitão que morava sim, em uma das  cavernas das redondezas e só de vez em quando, para conseguir comida vinha peregrinar na cidade. Com ele trazia uma velha sacola para juntar o que ganhava: feijão de vara, algum arroz, farinha, banha de porco, óleo de algodão, macarrão e as vezes ganhava pedaços de sabão de soda caseiro.

Esta velha sacola que lhe deu o apelido de Velho do sacolão.

 

O bom velho era temido por falar de um Deus vingativo que faria com  que o vulcão adormecido há milênios, acordadesse e sua erupção iria queimar todos pecadores daquela terra , que ele chamava de antro de pecados contra Deus. Somente seria arrebatado para o Reino dos céus, os puros, sem pecado e isto era raro.

- Arrependam de seus pecados antes que seja tarde!!!! 

- A ira de Deus está vindo e desta vez a galope!

 

- Poucos, muito poucos, talvez, nenhum, ninguém nesta cidade se salvará, se não se arrependerem.

 –SHEMAH! ISRAEL! Adonai elohenu! - Perdoa estes pecadores e não deixe que caiam de novo em tentação - Não deixe que sua ira desperte o velho vulcão adormecido!

- Lavas de fogo virão como raios, após um trovão e a cidade curvará a teus pés.!!!

- Aí será a hora do choro e do ranger de dentes, haverá gritos por misericórdia – mas será tarde. A ira de Deus cairá sobre Vulcânia. Outros  vulcões que há séculos foram adormecidos, obedecerão ao chamados divino e vão torrar e transformar em cinzas, os ímpios, as mulheres vaidosas e infiéis, os homens exploradores de outros homens que dão seu sangue no trabalho e continuam passando fome. Estes também queimarão no fogo vulcânico divino pela submissão, pela não reação! - Arrependam ou fujam, antes que queimem nas fogueiras ardentes das profundezas dos infernos, para sempre.

 E na praça, nas esquinas, em qualquer lugar que o velho parava, juntava gente para falar de suas visões e mensagens que   Deus que lhe passava  para aquele povo pecador, impuro, hipócrita da cidade. O velho do sacolão era o mensageiro do armagedom, do fim do mundo naquele povoado tão bucólico e cheio de vida.

O Padre Afonso, o pároco da cidade, ficava incomodado com aqueles fiéis que quase não iam à missa porque  achavam que o seu sermão cansativo -  mas para escutar o velho Pai da mata, passavam horas.

 

É neste cenário paradisíaco e enigmático  dominado por  duas famílias muito importantes ; os Belafontes e os Vaccarinis que  muitas coisas aconteciam.

A família Belafontes tinham o controle do comércio, da  produção e comércio de café. Já os Vaccarinis controlavam a produção de gado de corte e também da  produção de leite, de queijo, enfim a do laticínio.

A população, desde os pequenos comerciantes , os butequeiros até os boias-frias , trabalhadores volantes dependiam da riqueza destas famílias sempre envolvidas com a política e com a Igreja.

Estas famílias sempre viveram em harmonia, assim como o povo em sua maioria ,cristãos católicos tementes à Deus e tinham como líder religioso naquela época, o rígido Padre Afonso que além de pároco, era o conselheiro oficial  de todo o povoado. A maior diversão das famílias , principalmente dos mais jovens estava nas  festas religiosas que aconteciam com frequência na Paróquia Nossa Senhora da Chama Eterna, uma belíssima e imponente igreja toda construída no estilo barroco , herança dos áureos tempos da extração de esmeraldas e diamantes, época da Colônia e do Império. 

A praça da Matriz com seu chafariz e um grande coreto onde acontecia apresentações de cantorias, teatros e também discursos políticos era e ainda é o ponto de encontro e entretenimento dos cidadão vulcanienses e onde se falava de tudo e de todos e também onde os jovens marcavam encontros  amorosos ou flertavam com com suas pretendentes.

E foi assim que nosso herói Ângelo Belafontes conheceu Beatriz da Silva, a nossa heroína Bia que me faz contar a vocês todaa  saga, toda a história.

            Vamos lá?

 

            Ângelo era daqueles jovens que cresceu no povoado  participando de tudo, tinha amizade com todos, não discriminava ninguém pela condição social, por idade e muito menos pela cor da pele. O rapaz era bem popular embora tenha nascido em berço de ouro, na tradicional família Bellafontes.Tinha sempre um sorriso, uma brincadeira, um carinho para com todos e todas, seja criança, adulto, idoso, idosa, rico ou pobre, branco, negro, caboclo, oriental, enfim, a simpatia em forma de pessoa.

 Até os 17 anos viveu com a família na cidade de onde nunca saía nem a passeio, porém com o término do colegial, o ensino médio atual, foi necessário ir para a capital para estudar Medicina, um sonho que era muito forte na mãe dele e nem tanto nele que queria mesmo era ser Engenheiro Agrícola. Embora os pais tivessem dinheiro para pagar qualquer universidade do Brasil ou do mundo, Ângelo impôs uma condição: tinha que passar em vestibular de uma universidade pública e assim, com muito estudo em cursinhos, morando em repúblicas e moradias de estudantes na cidade grande, passou no vestibular da Universidade Federal e sempre que tinha férias visitava os pais e os amigos de Vulcânia onde passava todo tempo envolvido com as atividades da família e das diversões com amigos. 

 O seu melhor amigo sempre foi Augusto, rapaz de mais ou menos a mesma idade , hedeiro da família Vaccarini que também estudava na Capital, onde cursava veterinária. Consta que os dois dividiam um apartamento na Capital e seus pais bancavam as despesas da faculdade com livros e também as de cunho pessoal. Em uma  uma destas férias  de meio do ano, época de colheita de café, Ângelo e Augusto  vieram passar as férias na cidade onde aproveitavam para dar uma força nas fazendas de seus pais. Ângelo ia às sextas-feiras ajudar a fazer o pagamento dos boias-frias que colhiam café em uma das maiores fazendas de seus pais, a Fazenda Àgua grande. Já Augusto gostava de ficar na fazenda de gado durante o dia e na maioria das noites vinha para a casa de Ângelo de onde saiam a noite para as farras, bares , jogos de  bilhar e também iam à famosa Mansão das pedras, zona do baixo meretrício que ficava na primeira curva da estrada que liva Vulcânia à Candeias.

A vida de solteiro era muito boa para aqueles dois boêmios que nem pensavam em casamento. Porém o destino estava preparando uma surpresa para um deles: Ângelo:

 

Em uma tarde de sexta-feira,o rapaz foi fazer o pagamento dos boias-frias,  trabalhadores volantes que moravam na periferia da cidadezinha que iam de caminhão pau-de-arara toda madrugada para o árduo trabalhos nas fazendas e sítios  da região.  Naqueles verdes campos entre vales e montanhas de origem vulcânicas , estava Ângelo chamando por nome e em ordem alfabética, os trabalhadores homens , mulheres e até crianças que  faltavam à escola muitas vezes para ajudar os pais na luta pelo pão de cada dia.Naquela sequência de nomes anotados em uma caderneta, chamou em voz alta mais um nome :

 - BEATRIZ DA  SILVA !

 

     E assim surgiu em sua frente uma jovem de olhos bem expressivos da cor de mel, de lábios definidos, pele morena um tanto empoeirada pela lida do abanar café o dia todo. Por sobre os cabelos cacheados e negros como a noite, um surrado chapéu. Seu corpo era de bailarina, cintura fina e pelas vestes longas com uma blusa amarrada à cintura, era possível imaginar o belo biotipo da mulher genuinamente brasileira. Os olhos claros de Angelo cruzaram com os de Bia e ali aconteceu um fenômeno; a reação química que uns chamam de paixão, outros de amor à primeira vista. O rapaz ficou desnorteado, a moça também. A jovem chegou a tremer ao assinar o recibo após receber o salário da semana, o qual nem conferiu. Tratou logo de ir saindo em direção do caminhão coberto de lona, mas sem antes dar uma discreta olhada para trás para ter a certeza que o rapaz seguia seus passos com olhar pasmo e boca semiaberta. 

       Não demorou para terminar de pagar a todos os trabalhadores e assim viu o caminhão se preparando para o retorno à cidade. Um dos peões que administrava aquela fazenda percebeu o embaraço do patrãozinho, mas disfarçou, afinal não tinha tanta intimidade com o rapaz que só aparecia uma vez ou outra quando estava ocioso de férias.

       Ângelo, então disse um "até mais" com um aceno, deu partida no seu JEEP e vazou pela estrada de terra, cheia de curvas na tentativa de acompanhar o pau -de- arara e descobrir onde aquela linda boia-fria morava para que se aproximasse um pouco mais dela e  conquistasse o seu coração.

 

 

                       O amor deixa marcas, sequelas, inquietações.

 

 

            Ângelo acelerou seu Jeep e conseguiu alcançar o pau-de-arara quando este acabava de deixar alguns trabalhadores em uma casa em uma rua de chão batido na periferia da cidade, porém já havia parado antes em outras localidades, porém mesmo assim continuou a seguir discretamente o caminhão até que este desembarcasse todos , mas em um ponto viu a moça que lhe despertou tanto interesse. chegou a pensar em perguntar para o motorista sobre onde desceu a jovem, mas preferiu ficar "na dele' para não despertar especulações. Ao chegar em casa encontrou seu pai, sua mãe e sua irmã Simone sentados na grande varanda e o velho Julião Bellafontes foi logo perguntando:

- Tudo certo com o pagamento da turma? - Você demorou, heim rapaz!

- É que resolvi ficar um pouco mais na fazenda dando uma olhada no cafezal.

          Dona Sérgia, sua mãe notou algo de diferente em Ângelo e comentou:

- Tudo bem por lá na fazenda? -  Vá tomar um banho, descanse um pouco - nada de farra com os amigos hoje heim?

 - Tá certa, mãe - vou dormir mais cedo hoje.  - Não acredito - você, meu irmão, ficar em casa em uma sexta-feira? - Só vendo para crer - Comentou Simone, sua irmã bem mais jovem que ainda estava terninando o Colegial e que também era uma garota muito espevitada , brincalhona, companheira de Dona Sergia e querida por todos naquele povoado.

     Aquela foi uma sexta-feira tranquila, sem visitas, sem festas na cidade e  assim todos dormiram mais cedo, porém o rapaz não conseguia parar de pensar na beleza  daquela linda jovem boia-fria: Beatriz da Silva.

- Haverei de encontrá-la - vou à fazenda na segunda, ela deve estar de volta - pensou o rapaz.

        Já era tarde de sábado quando Augusto,  chegou da fazenda Àgua Viva, onde ajudava quando estava de férias, na lida com as vacas leiteiras e também ovelhas que os vaccarini criavam mais para consumo deles mesmo. Augusto chegou com trajes de "cowboy" com calças "US TOP", botas e camisa chadrez - só faltou as esporas e o cavalo zaino.  Como haviam combinados de  sair para jogar sinuca e encontrar os amigos no bar mais frequenbtado de Vulcânia, o Bar da Portuguesa,ponto de encontro dos filhos de fazendeiros da região e  lá entre zoeiras, bebidas e tacadas de sinuca, Ângelo acabou falando com o amigo sobre política, a situação dos estudantes na capital, sobre a luta as guerrilhas que estavam surgindo na luta contra o governo de generais que estavam no poder,mas também acabou revelando seus sentimentos por a tal Beatriz da Silva e como tudo aconteceu. Augusto, em princípio, não apoiou o amigo.

- O que é isso, cara  - tá louco? -Você me conhece e sabe que não tenho preconceito de classe social, muito menos de etnias, mas nós dois sabemos que não dá certo uma relação onde há um desequilíbrio de nível intelectual - você , um futuro doutor, aliás falta pouco para se formar e vai assim se envolvendo com uma desconhecida, trabalhadora rural, certamente uma semi-analfabeta!

 - Fica difícil a comunicação entre vocês. - Olha a discrepância de linguagem, de culturas ; sua mãe jamais apoiaria, com certeza.

- Pera aí meu caro amigo! - Eu disse que fiquei amarrado na beleza meio que selvagem da moça, daí a me casar com ela - ah já é outra história. 

-Ah bom! - entendi.  -  Você quer mesmo é uma curtição, uma aventura; você quer é desfrutar de um "rala e rola" no meio do cafezal, não é? - Até aí, até eu que não sou bobo nem nada, também quero,mas no fundo, Augusto não queria era perder o amigo de aventuras e também de lutas. Os dois participavam de movimentos de protesto contra o regime militar vigente no país e as vezes tinham problemas com isso, mas nada contavam a seus pais que eram extremamente coservadores e apoiavam o regime que beneficiava fazendeiros, latifundiários, grandes comerciantes e industriais. E por conta de mais um ato de protesto de estudantes na capital, Augusto estava decidido a retornar lá, pois  não queria ficar fora da mobilização que estava sendo planejada às escondidas.

 - Volto amanhã para a capital, você fica mais uns dias, não é Ângelo?

 - Aproveita então! - Estas mocinhas da roça se fazem de inocente , mas devem ser mesmo é bem sapecas, se é que você me entende.

-  Epa! - Nem todas! - Mais respeito! - Voc~e não entendeu foi nada!!

 - Vai dar uma força para os camaradas ! 

- Vou ficar  mais uns dias e só volto no primeiro dia do retorno das aulas. Diga aos companheiros  que desta vez não posso estar com eles, mas nas próximas passeatas, estaremos juntos. Muito cuidado, fica esperto ,porque estes capangas deste governo fascista não estão de brincadeira. Já temos muitos companheiros desaparecidos e sabemos que o pau-de arara come solto no DOPS.

Assim Augusto voltou para a capital e Ângelo ficou na expectativa de rever a sua bela Beatriz. Na segunda-feira, mal tomou seu café e saiu  cedinho para a fazenda na esperança de  encontrar a  moça na colheita de café juntamento com os outros trabalhadores. O rapaz ficou horas entre os cafezais, aqui e ali encontrava um pé de melancia de onde quebrava as mais bonitas e aproveitava. Também encontrava pés de mamão com frutas maduras e doces , mas da moça , nem o cheiro. Não quis perguntar para ninguém e nem mesmo para o capataz que de repente poderia lembrar-se  da moça. Não queria ser alvo de fofocas. 

  Sem notícias de Bia, chega mais  um fim de semana, mais uma  noite de sábado que  para Ângelo era um tormento, só pensava naquele ohar doce da moça, aquele rosto lindo embora empoeirado da lida da colheita de café.

 - Que magia é esta? - Será que isto é o que chamam de paixão? Pensava o jovem.

    Dona Sergia, sua mãe,  percebeu a mudança de comportamento do filho e não deixou de intervir.

- Ângelo, meu filho, estás com febre? - Comestes pouco no almoço, nem levantaste  para o café, estás a perambular pela casa, feito um zumbi!

 - Nem no futebol dos domingos a tarde , tu não fostes?  -  Até teu pai foi para o campo de bocha, do lado do gramado - ah  deve estar enchendo a cara no buteco e pagando cerveja  pras raparigas - aquele traste velho. - Dizem que o tal Velho do Sacolão está na praça da Matriz a contar suas lorotas e maluquices. - Esta gente parece que não tem o que fazer e ficam dando ouvidos para este doido!

-Até o cachaceiro do seu pai anda escutando as asneiras do Pai da Mata.

- Que é isso mãe! - Papai também tem direito de se divertir com seus velhos amigos e também de estar no meio  do povo - A Senhora não conheceu ele em um  campo de futebol? - Papai sempre foi muito popular.

 - É , popular até demais! -  Maldita tarde daquele domingo que fui naquele campo de futebol - Que Deus me perdoe! - Olha no que deu. Estou aqui neste cú de Judas!

 - Resmungou a velha senhora que carregava um sotaque de portuguesa.



             

           

                            



                      A matriarca e a amada, entre a cruz e a espada.







💕Ângelo vivia em um dilema: Contar ou não contar para sua mãe sobre o que estava acontecendo com ele; a paixão repentina por uma moça de familia pobre. Conhecendo bem a mãe que tinha, sabia que não teria nenhum apoio. Imagina um jovem bonito, bem criado,de família rica tradicional, um futuro médico, pode ter como esposa uma moça de famíla pobre, certamente, ignorante, sem estudos - Jamais!

Quanto ao pai dele e a irmã Simone, talvez seria mais fácil a aceitação pois eram menos preconceituosos, inclusive, dizem à boca pequena que o velho, era  de origem humilde das bandas das Minas gerais onde era peão de fazenda, cuidava de vacas leiteiras que acabou se casando com Dona Sérgia, esta sim de família tradicional portuguesa e espanhola.

 Dona Sérgia era uma senhora de bem, pela moral e bons costumes, uma cristã católica conservadora , fervorosa. E por estas virtudes ,era sempre convidada a ser madrinha de crianças assim que nasciam. Como uma boa cristã, a matriarca da família praticava a caridade ajudando famílias carentes pobres  e até nordestinas   negras, que por lá apareciam em busca de trabalho nas colheitas de café. 
Dona Sergia fazia parte de um grupo de Senhoras misericordiosas que uma vez por semana visitavam a Santa Casa de Misericórdia, onde levavam orações e conforto aos doentes e muitas vezes promoviam Chá Beneficente com bingos, rifas, livro ouro, onde as pessoas assinavam e faziam doações em dinheiro e sempre para a caridade, a benvolência desta irmandade. Ao menos duas vezes por ano, a Irmandade promovia a Marcha para Jesus junto com os soldados de Cristo, jovens doutrinados à obediência aos preceitos cristãos, verdadairos guardiões dos mandamentos da Santíssima Igreja Católica Apostólica Romana. O Padre Afonso estava sempre à frente carregando o Santíssimo Sacramento e puxando terços , cantos de louvores à Eucaristia e à Imaculada Conceição de Maria, Nossa Senhora.
Na cabeça de Ângelo, uma senhora como sua mãe, católica fervorosa como era, não podia ser preconceituosa, não podia criar obstáculos com o seu  relacionamento   com uma moça de família humilde, mas primeiro precisava encontrá-la e conquitá-la.
Assim pensava  o jovem rapaz que arquitetou um plano para que  sua mãe o encontrasse com a sua bela Beatriz poupando ele de ter que se abrir com ela.
A fazenda Água Grande, a maior da família e onde Angelo conheceu Beatriz era administrada por Seo Chico Mulato, homem de confiança dos Belafontes, uma espécie de capataz que cuidava de dar colocação, dispensar e cuidar das 14 famílias que moravam na colônia da fazenda. Estas famílias trabalhavam como  porcenteiros, sistema em que toda a colheita de café ou de outras lavouras que estas famílias produziam. Metade da fazenda foi dividida em lotes de terras que variavam entre 5 a 15 hectares de acordo com o tamanho de cada família.
A colheita de café, a porcentagem era de 40% para o colono e 60% para o patrão, no caso, a família Belafontes. Outras lavouras como algodão, amendoim, mamona, a divisão era de 50%.

Voltando ao plano de Ângelo,  estavam chegando as festas do mês  de junho. Era tradição na fazenda e na região, muitas festas religiosas de São João, Santo Antonio e São Pedro onde rezavam terços, erguiam mastros com a imagem dos 3 santos, soltavam muitos rojões, busca-pés, bombinhas e traques barulhentos. Dançavam muito com animação de sanfoneiros, além das danças da quadriha  que era também realizada  na praça da matriz da cidade, todas as noites, durante 15 dias da Grande Quermesse com várias barracas de comidas típicas, da pesca, de laçar garrrafas de " CRUSH" "COCACOLA" e outros refrigerantes. Tinha também a cadeia do amor onde jovens eram sequestradas e presas por cangaceiros e ali ficavam até seus pretendentes pagarem a fiança.
Você já percebeu que o plano de Ângelo para conquistar sua amada e fazer com sua mãe os vissem juntos, tinha  tudo a ver com estas festanças?

Pois bem! As festas juninas estavam pipocando por todos os lados,  a cidade estava toda enfeitada de bandeirinhas ,  rojões, busca-pés  e também fogos de artifícios estouravam para todos os lados. Asdanças de quadrilha, forrós e muitas rezas de terços pelas ruas, casas de famílias , nas igrejas, tudo era alegria!




   No momento em que festas de tradições caipiras estavam acontecendo por todos os lados, com a cidade  toda enfeitada de bandeirinhas, balões, algo de estranho acontecia na capital: Augusto não dava notícias. Ângelo evitava telefonar pois a maioria dos telefones da cidade grande, estavam grampeados. O combinado era que Augusto utilizasse os correios para se comunicar com o amigo e mesmo assim, que escrevesse em código de modo que somente eles compreendessem.

 

Ângelo, apesar de estar preocupado com o que poderia estar acontecendo com Augusto e os companheiros da universidade, após dar um passeio pelo Arraiá da praça foi para a festa da fazenda Àgua Grande na esperança de encontrar sua amada Beatriz. A festa por lá estava bem alegre com muitas barracas, uma mais animada que a outra e lá estavam sua mãe, seu pai e sua irmã Simone.

 

Naquela noite, Ângelo estava sem seu velho e bom companheiro Augusto com o qual estava preocupado. Mas tinha muitos amigos na cidade e também admiradores. Por ser um jovem desprovido de qualquer preconceito ,era muito querido tanto entre os mais abastados, mais ricos quanto a as mais humildes, volantes boias-frias. Aquela noite de sexta-feira estava agradável, o clima estava bom, nem calor e nem frio com costumava fazer em anos anteriores, afinal era a estação do inverno. A lua estava cheia , grande e imponente flutuando em um ceu escuro sem estrelas para concorrer com sua beleza.

Ângelo chegou à sede da fazenda onde a festa já estava muto animada, com muita música de sanfona, triângulo, viola , enfim, o forró pé-de serra,corria à solta. Entre cumprimentos, bajulações de uns e outros interessados em cachaça e quentão de graça, porque o rapaz não economizava quando se tratava de agradar as pessoas, independentemente da condição social ou etnia, seu olhar buscava uma moça que não saía dos seus pensamentos: Beatriz da Silva, a doce Bia, para os mais íntimos. Se o povo da cidade e de toda a região não perdia por nada , aquela tradicional festança, Beatriz certamente seria encontrada por lá. Mas a vida , às vezes é como uma novela. A natureza conspira a favor de quem ama, de quem deseja, de quem busca a felicidade nem que seja por alguns momentos.E assim, nesta angústia, o  jovem ao encostar no balcão de uma barraca, a da pesca, sentiu umas mãos perfumadas tampando seu rosto para que adivinhasse quem era. 

Pelo perfume almiscarado e envolvente, ele reconheceu logo que se tratava de Joia, ou Dona Joia, como agora era assim tratada pelo povo do lugar.

- Joia? - Você por aqui?

- Como me reconheceu meu amigo?

- Ora! - Quem que eu conheço que usa almíscar? - Além das mãos mais macias do mundo?

- Pois é, amigo. O almíscar, dizem que é masculino, mas é o meu perfume preferido. - Já as mãos macias é gentileza sua.  Estas mãos já pegaram no cabo da enxada, já colheram café, algodão, não nasci em berço de ouro como você meu lindo amigo!

   -  Lindo, é bondade sua, mas  você uma guerreira, me diga -  o que está fazendo da vida depois que perdeu o seu marido? Jóia era uma bela jovem negra, crescera e estudara na mesma escola rural que Ângelo, havia perdido o marido, fazia pouco tempo.

- Estou na luta. Administrando as terras que me couberam de herança- não é uma tarefa fácil, mas até que não é tão difícil assim. Preciso seguir com a minha vida.

- Mas e você, Ângelo, não vai nunca se apaixonar de verdade? - Dar netinhos para dona Sergia?

 - Então Dona Joia.-  Não espalha, mas finalmente o cupido me pegou. Conheci uma linda trabalhadora aqui na fazenda quando vim pesar o algodão – Você acredita que  não consigo tirar ela da minha cabeça. - Toma aqui um quentão, vou contar, acredite se quiser.

 -  Acredito sim, ah se acredito! – Então - eu conheço quase todo mundo desta região, quem sabe, vou poder te ajudar.

 -  Então, só sei que o nome dela é Beatriz da Silva e mora no Encantado.

 -  O quê? - Será minha amiga Bia? - descreva mais -  como ela é?

 - Ela é linda, encantadora! Morena, cabelos cacheados, alta, olhos misteriosos, meio amendoados, é uma beleza de moça!

 - Este mundo é pequeno mesmo. A Bia é minha amiga. Mora no Encantado, mas trabalha em Candeias. De vez em quando, nas férias vem ficar com sua família e vai para a roça também.

Então é isso. - Você caiu do céu, dona Joia. Vai me passando o endereço desta moça que mexeu demais comigo. Será que é solteira?

- Sim, ela é solteira, desimpedida, mas quanto ao endereço, tem um probleminha.-  Ela trabalha no Convento das Irmãs Silvianas, congregação fundada por Santo Silvio no início do século XIX, lá para as bandas de Rondônia e lá não entra rapazes, nem cartas de pessoas que não sejam da família, são entregues. Mas.....

- Mas? - Vamos Joinha, diga logo como chegar até ela?

- Então, a Madre superiorade  lá,  é minha amiga. Ano passado pude entrar lá para uma visita e  conheci o trabalho que elas fazem, até dou uma ajuda todos os meses para as obras sociais delas.

- Deus é mais - vamos lá neste sábado? - Amanhã?- Ela somente trabalha lá , não é?-  não pretender ser freira?

-  Calma rapaz. Preciso agendar primeiro. Tenho que telefonar e pedir autorização.

   - Amanhã de manhã eu ligo. Se autorizarem eu te levo. No meu carro. E lembre-se. Você não entra. Vai ficar e esperando no jardim em frente. – Quem sabe eu consigo autorização para dar um passeio com minha amiga e vocês podem conversar, quem sabe!

- Assim você poderá abrir seu coração a ela, antes que decida se tornar freira!

-Combinado Dona Joia - você caiu do cèu.

- E pare de me chamar de Dona Joia – sou um pouco mais velha que você sim, mas somos amigos desde a infância!

-Está bem, pérola! – Você vai me levar até ela, não vai?

- O que não faço em nome do amor? - E ainda por meu amigo , o homem mais bonito do mundo?

E assim combinaram qu Joia agendaria uma visita à amiga no Convento das Silvianas em Candeias e avisaria Ângelo sobre o dia e horário marcado. Aquele fim de semana foi muito animador para o jovem apaixonado, ele particpou de várias festas, porém não deu ousadia a nenhuma das várias donzelas que estacvam sempre o assediando, o rapaz nunca havia recebido tantos correios elegantes nas festas juninas, sem falar nas diversas vezes que o rapaz foi sequestrado pelas prendas na Cadeia do Amor, mas logo pagavam para liberta-lo desde que ganhassem um beijo ou um abraço. Apesar da alegria das festas, neste fim de semana , o nosso herói , para surpresa de seus pais e até da sua irmã Simone, chegava sempre mais cedo em casa, sempre antes das duas da madrugada.

- Mas já , meu irmão. A festa não estava boa? - Eu, que sou obrigada a voltar antes da meia noite como se fosse a gata Borralheira por ordens de mamãe, você, não! - Sempre chegou de manhã cedo, isso quando não ficava na casa do Guto, ou de outro amigo.

- Vá dormir , Simone - você está precisando é arrumar logo um namorado para deixar de cuidar da minha vida! 

- Vai você, seu cara de cuia mal lavada - estou assistindo .....

Na segunda-feira, antes do meio dia, um carro Ford vermelho, parou na frente da mansão dos Belafontes e alguém bateu palmas. Antes que Zilu, a empregada fosse atender, Ângelo deu um salto do sofá e foi ao encontro de Dona Jóia.

- Não quer entrar?-  A mãe e Simone estão ai! 

- Não amigo, só vim avisar pessoalmente que a visita à minha amiga, já está agendada. Será no próximo domingo às 9h00 da manhã até o meio dia. Se prepara. Eu disse a ela que um amigo meu iria me levar, com o carro dele, pois eu estou com problemas nos pés e joelhos, sem poder dirigir.

Nisso Dona Sérgia apareceu no Jardim, curiosa para saber de quem se tratava.

- Ah, é você Joinha! - Porque não entra. - Vamos chegar, mulher!

- Agradeço, Dona Sérgia, só vim dar um recado do prefeito para o Ângelo, agradecida - tenho muitos afazeres no sítio. - Outro dia a gente conversa.

Dona Joia era viúva ,de família pobre que veio com a família ,ainda criança, da região de Candeias onde a família trabalhava nas roças de algodão. Joia era uma  moça negra muito bem resolvida, empoderada e guerreira. Gostava de cantar músicas do Roberto Carlos enquanto colhia algodão e foi em uma dessas colheitas qu caiu nas graças de Fernando, irmão mais velho de Augusto da família Vaccarini, com quem se casou,apesar de nunca ter sido bem aceita pela sogra, por conta de ser escurinha, ou torradinha como era tratada pela mãe do seu marido.

Após o casamento, Joia passou a viver com o marido na fazenda dos vacarinis e no primeiro momento , morou na casa grande  com a família de Fernando. Quando percebeu que estava sendo explorada pela sogra que queria transformá-la em escrava responsável por todo o serviço doméstico daquela casa , Joia exigiu que o marido construisse uma casa para eles na fazenda e mesmo contrariado pela família dele, acabou atendendo o pedido da amada.

Fernando era um bom rapaz, trabalhador, carinhoso com a família, com a esposa,mas gostava de frequentar botecos , onde muitas vezes arrumava encrencas com alguns forasteiros metidos a valente que frequentavam as vendas e a zona do baixo meretrício que ficava na estrada que liva Vulcânia à candeias.

E em uma destas brigas, o homem foi ameaçado de morte por um jagunço que estva na casa da Portuguesa. Fernando não levou muito a sério, mas o matador de aluguel não esqueceu e em uma tarde de sexta-feira quando retornava com seu cavalo da cidade para a fazenda, foi surpreendido pelo jagunço em uma tocaia e assassinado com um tiro certeiro na cabeça, conforme depoimento de eum sitiante que estava próximo a encruzilhada onde ocorreu o crime. O assassino desapareceu e nunca foi encontrado. Joia ficou inconsolável, pensou em ir embora da cidade, mas decidiu lutar por seus direitos de viúva e foi quando acabou tendo como herança , um sítio que era da fam´lia na região das montanhas douradas, ao lado da Fazenda Água grande que pertencia aos Belafontes.

Neste  pequeno sítio, ela passou a produzir hortas, granjas de galinhas, produção de ovos , frangos caipira, verduras e legumes em geral que abastecia as vendas da cidade e região.Joia decidiu não se casar novamente, pois sempre foi uma mulher independente. Ela era muito querida por todos na cidade, embora tenha se afastado da família do falecido marido. Por ser uma grande parceira de amizade com Ângelo Belafonte, era tolerada por sua mãe, dona Sérgia.

A mãe de Ângelo Belafonte, tinha uma certa fama de racista, ela não suportava negros, tolerava porque o Padre Afonso dizia em seus sermões que" torradinhos" também eram gente, eram Filhos de Deus. Nem sua empregada , era negra como a maioria.

 Zilu era branca, de origem" barriga verde", como eram chamadas as pessoas que vinham da região sul do país., mais especificamente do estado de Santa Catarina.

Tinha os olhos claros e cabelos louros. falava com sotaque de gaúcha e tomava chimarrão em uma cuia de alumínio.

Joia evitava se aproximar da mulher tida como a guardiã da moral e dos bons costumes, a  Dona Sérgia, mulher virtuosa e caridosa.

A visita à Beatriz e  o encontros de almas gêmeas.

O encontro de almas gêmeas.



Era um domingo de manhã, Joia se preparava para para ir visitar Bia na companhia de Angelo quando ouviu pessoas batendo palmas na frente da sua casa do bairro Tijuco Branco onde ficava nos fins de semana. Eram 2 mulheres muito bem vestidas com um livro nas mãos , pareciam Bíblias. Com suas sombrinhas coloridas para proteger suas peles brancas do sol já escaldante se dirigiram à Dona Jóia e uma delas foi falando:

- A Senhora aceita ouvir a palavra de Deus? - A sua salavação está nas mãos do Senho, mas é preciso se converter!

- Bom dia, Senhoras. Tenho minha religião, participo diariamente dela em comunhão com a Irmandade, pratico a caridade, o amor ao próximo e sou convertida desde criança quando fui batizada, portanto é melhor que as senhoras procurem pessoas desamparadas, desorientadas , perdidas nos vícios e na fornicação da luxúria ou da prostituição para doutriná-las na sua crença. E agora , me dão licença que estou atrasada para um importante compromisso. E assim foi dando ré em seu Jeep e saiu levantando poeira.

Enquanto isso, na casa dos Vaccarinis, Angelo já pronto, tomava café com sua família. Sua mãe, curiosa ,perguntou:

- Então hoje tu vais com a gente na missa, filho! - Vejo que estais pronto.

- Não, mãe, vou em Candeias e talvez eu só volto no fim da tarde.

- Mas você nem preparou o carro, rapaz! - Ou vai de carona com este teu amigo grudento, o tal de Augusto - perguntou seu pai.

- Vou de carona sim, pai, mas não é com Augusto.- Vou com Dona Joia no carro dela.

Naquele  domingo de manhã, Joia se preparava para visitar Bia na companhia de Ângelo quando ouviu pessoas batendo palmas na frente da sua casa do bairro Tijuco Branco onde ficava nos fins de semana. Eram 2 mulheres muito bem vestidas com um livro nas mãos , pareciam Bíblias. Com suas sombrinhas coloridas para proteger suas peles brancas do sol já escaldante se dirigiram à Dona Jóia e uma delas foi falando:

- A Senhora aceita ouvir a palavra de Deus? - A sua salavação está nas mãos do Senhor, mas é preciso se converter!

- Bom dia, Senhoras. Tenho minha religião, participo diariamente dela em comunhão com a Irmandade, pratico a caridade, o amor ao próximo e sou convertida desde criança quando fui batizada, portanto é melhor que as senhoras procurem pessoas desamparadas, desorientadas , perdidas nos vícios e na fornicação da luxúria ou da prostituição para doutrinar na sua crença.

 E agora , me dão licença que estou atrasada para um importante compromisso. E assim foi dando ré em seu" maverick" azul turquesa e saiu levantando poeira.

Enquanto isso, na casa dos Belafontes, Ângelo já pronto, tomava café com sua família. Sua mãe, curiosa ,perguntou:

- Então hoje tu vais com a gente na missa, filho! - Vejo que estais pronto.

- Não, mãe, vou em Candeias e talvez eu só volto no fim da tarde.

- Mas você nem preparou o carro, rapaz! - Ou vai de carona com este teu amigo grudento, o tal de Augusto - perguntou seu pai.

- Vou de carona sim, pai, mas não é com Augusto.- Vou com Dona Joia no carro dela.

- O quê? - Retrucaram ao mesmo tempo, seu pai Julião sua mãe - sua irmã Simone, apenas observava.

- Você vai para Candeias de carona com a viúva negra? - Replicou sua mão com ironia.

- Vê lá em rapaz. - Você pode ser a próxima vítima da marafona - disse seu pai em tom de brincadeira.

- Gente, vocês não estão vendo que Jóia está apenas sendo cupido de alguma linda moça para um encontro com meu irmão? - Deixa Ângelo ser feliz - brincou Simone!

- Você não tem jeito, minha filha! - Está sempre passando a mão na cabeça de seu irmão.



Nisso, ouviram a campainha. Era  Joia que havia chegado para conduzir Ângelo até sua bela amada Beatriz.

- Ela vai dirigindo aquela joça? - Vê lá em filho. - Mulher no volante,.... já viu - Ah- Cuidado com a língua do povo! - Fica andando por aí com esta mulher, fica! - Depois não diga que não avisei. Esbravejou sua mãe.

- Porque vocês não vão logo para para a  missa? - Já estão atrasados - O padre vai ralhar com vocês.

 - Deixem-me em paz. - Sei o que estou fazendo, tchauuuu.



 

 




       

 Dona Sérgia e Simone foram  atender o portão ,mais pela  curiosidade - quem sabe  Joia revelaria o real motivo do passeio até a cidade vizinha?

- Bom dia Dona Joia, meu irmão já está vindo, diz Simone.

- Bom dia Joia, vamos entrar? - Vem tomar um café - acabei de tirar do forno um bolo de cenoura com cobertura de chocolate, diz Dona Sérgia com ares de curiosidade com uma pitada de falsidade.

- Obrigado Dona Sergia, agradeço, mas fica para outra oportunidade - combinei com Ângelo da gente ir até Candeias fazer uma visita ao Santuário da padroeira ,para  agradecer pela colheita de café e também das minhas frutas e verduras  que foi muito boa neste ano, não foi?

- Eu também estou precisando ir agradecer colheita do café e rezar pelos meus pobres , mas o meu marido , sabe como é - só que saber da bebedeira com estes cachaceiros da cidade.

- Pontual heim?- Vamos então Dona Joia! - interrompe Ângelo.

- Você vai de passageiro, meu filho? - Joia sabe mesmo dirigir por estas estradas perigosas cheias de curvas até Candeias?

 - Fica tranquila, mãe, eu confio nesta motorista aqui, Joia é uma das melhores motoristas que já conheci.

- Acredito, meu irmão! - Você precisa me ensinar a dirigir também, replica Simone.

- Vou pensar no seu caso, minha irmã.

E assim, Joia e Angelo se despedem e pegam a avenida que dá acesso à estrada rumo à Candeias.

- Mistério! Neste angu tem caroço, resmunga  Dona Sérgia.

 - Ângelo nunca foi de rezas, mal vai às missas do padre Afonso e  quando eu insisto muito! - Aí tem coisa.

- Então, mãe. As pessoas mudam com o tempo. - Responde Simone.

Duas horas depois, Ângelo e Joia já estão em Candeias onde ela deixa o carro estacionada na Praça da Matriz sob os cuidados de Ângelo e se dirige ao Convento das Irmão Silvianas que fica ao lado da imponente Igreja, o Santuário de Nossa Senhora das Candeias.

O combinado é queJoia  pediria autorização à Madre Superiora para fazer um passeio com a amiga Beatriz e assim ela encontraria com o seu apaixonado Ângelo Belafonte.

Obviamente, Joia avisara Bia que não estava só e que queria que ela conhecesse um amigo que a acompanhou até a cidade.

Ângelo estava ansioso, chegava a roer as unhas, após ter tomado uma "Crush" refrigerante com sabor de laranja que era muito vendido na época. Mascava chicletes, tentando conter o nervosismo, olhava o movimento da praça, do comércio, pensou em ir até a MESBLA ou Casas BURI comprar um presente para sua amada, mas achou que não era o momento certo para encher a moça de mimos.

A ansiedade era tanta que o rapaz teve vontade de fazer xixi, olhou para a praça e viu um banheiro público onde foi logo "tirar água do joelho" expressão usada na região. Nisso chega Joia acompanhada de Bia e não encontra o rapaz. 

- Onde está o seu amigo que você tanto quer me apresentar, minha amiga!

- Deve ter ido tomar uma água.

Neste momento apareceu Ângelo, que meio sem graça foi logo dizendo.

- Você se lembra de mim, Beatriz da Silva!

Bia ficou sem ação ao ver o rapaz. Sentiu uma pulsação tão forte no coração e as pernas ficaram bambas. - Preciso me sentar. Havia um banco destes de praça ao lado do carro e ela se acomodou e meio com a voz ofegante, respondeu; - Claro! - Lembro sim. - Você é o moço que um dia fez o meu pagamento lá colheita de café em Vulcânia. 

- Não sabia que você era amigo de Joia, também. - Que bom que veio? - Então, vim porque quero conhecer mais sobre você!  - Vou comprar umas coisinhas , não demoro. - Fiquem conversando, se conhecendo um pouco mais - vou ao Pão de Açúcar, lá sempre tem boas ofertas, até logo mais - disse Joia com ar de mistério.

Ângelo, então convida Bia para almoçar no Madalosso, restaurante italiano famoso em candeias. - É um lugar de gente rica, não sei se vou me sentir a vontade num lugar desse, respondeu Beatriz.

- Se preferir, vamos à lanchonete da praça, podemos comer um lanche e depois tomar um sorvetão.

- Me  desculpa , mas prefiro.

Não precisa pedir desculpas, vai ser até mais divertido, a lanchonete Mandiopão!

E assim os dois foram à lanchonete, comeram um lanche e depois sairam caminhando na praça toda florida e com suas lindas palmeiras imperiais.

Com aquele clima, natureza, pássaro, flores não tinha como não rolar um romance. Ângelo viu que no canto da boca de Bia havia um restinho de sorvete. Pegou seu lenço branco e limpo e se ofereceu para limpar e foi aí que não resistiu e roubou um beijo de Bia que ficou de novo com as pernas bambas. Beatriz sentou em um banco, fixou bem seus olhos nos olhos claros do rapaz e com aquela voz doce , falou:

- Você não devia ter me beijado. Sou uma moça de família pobre, sou muito simples, não posso me iludir , acreditando que você pode querer algo sério comigo. Já sofri muito nesta vida e......

- Ângelo não se aguentou e tascou nela desta vez, um bijo mais demorado.

- Eu te amo minha princesa - desde que a vi naquele cafezal com o rosto conberto de poeira- não consegui dormir direito - seu rosto lindo , seu jeito de ser não saia da minha cabeça.

- Mas......

- Não diga nada ainda? - Deixa eu dizer mais sobre o meu amor por você, deixa...

_ Quer namorar comigo! - Você acha que eu sou digno do seu amor? 

- Claro que sim, Ângelo! - Eu também não esqueci mais daquela tarde, seus olhos azuis, seu rosto, seu sorriso - como esquecer do jeito que você olhou para mim? - Não voltei mais à Vulcânia desde aquela tarde - não podia correr o risco de te encontrar, mas.....

- Ângelo, bastante emocionado faz carinho nos cabelos da jovem - mas....qual o problema ?

 - Sempre sonhei em encontrar o amor da minha vida e agora, tenho certeza que encontrei.

- Como vamos nos encontrar? Posso vir aqui aos fins de semana te ver?

- A gente dá um jeito, meu amor.

 - De vez em quando a Madre superiora me dá uns dias de folga para visitar minha família - eu aviso você através da nossa amiga Joia. - Aliás ela já deve estar esperando a gente lá no carro - vamos? - Também preciso voltar ao Convento, tem muito trabalho me esperando.

- Vamos, tem razão. 

E os dois pombinhos foram de mão dadas, as vezes Ângelo a abraçava e a beijava até que chegaram onde estava o carro onde Joia os aguardava.

- Gostaram do passeio heim? - Que bom que se entederam, se é que me entendem.

- Ângelo sorriu e abraçou também a sua amiga , sua cúmplice , sua cupido sem flexas, nem asinhas.

Ali mesmo, Ângelo se despediu de sua amada com um abraço apertado e um longo beijo e seguindo recomendações de Joia, não acompanhou as amigas até o portão do convento.

Já de volta, desta vez Ângelo veio dirigindo todo animado escutando no rádio da maverick de Joia , canções românticas de Roberto Carlos, Odair José, Diana,Celly Campelo, Vanderleia, Beatles e Joia também cantarolava " De que vale a minha boa vida de play boy, se entro no meu carro e a solidão me dói." Foi uma viagem de volta muito divertida. Por volta das 7h00 já noite chegaram em frente da mansão da família Belafonte.

- Não tenho como agradecer minha companheira de lutas! - Hoje você me presenteou com o dia mais feliz da minha vida! - Não sei ainda como vou aguntar ficar uma semana ou até mais sem ver minha princesa, mas um dia de cada vez, obrigadoooooo!

- Joia sorriu dizendo:

- Ai de você se fizer Beatriz sofrer. - Ela é que nem uma filha ou irmã mais nova para mim, até mais! - Vou pegar meu rumo até meu aconchego!

Ângelo entrou, abriu o portão da mansão e já no jardim estranhou o silêncio em sua casa.

As luzes das varandas e dos jardins estavam acesas, da sala e os outros ambientes todas escuras, exceto a luz do seu quarto no segundo pavimento, estava acesa. O rapaz estranhou.

- Já sei. - Foram para a missa, o pai deve estar por aí nas corrutelas ou nos butecos, mas quem está no meu quarto?-  Pensou o jovem.

Logo viu que algúem abriu as persianas do seu quarto e apareceu na janela.

Era seu melhor amigo Augusto que ao retornar da capital não encontrou o amigo em casa, ficou esperando. Como Dona Sérgia e Simone tinham que ir à missa das sete da noite. Dona Sérgia pediu a Augusto,que  aguardasse Ângelo no quarto dele.

- Até que enfim, heim? - Estou te esperando desde as 4. - A festa estava boa em Candeias?

Foi dizendo, Augusto enquanto vinha ao encontro de Ângelo na escada estilo colonial que dava acesso à sala de visitas.

- A festa? - Ah! - Foi brasa, mora? - Foi a melhor festa de toda a minha vida.

- Augusto deu um abraço no amigo.  - Sei. - E que festa heim? - Encontrou finalmente sua camponesa? - E aí, conquistou a donzela?

 - Tá certo meu camarada! - Aproveite bem a vida porque na Capital as coisas vão de mal a pior. - O pau está comendo solto nas costas dos companheiros.

- Filhos da puta? - Até quando esta cambada deste governo vai perseguir a gente? - Pegaram mais algum dos camaradas?

- O pior é que pegaram.-  Lembra do Levi, aquele ex-seminarista? - Lembra da Luiza, a jornalista?

 - Estão desaparecidos. Sabe lá Deus se ainda estão vivos.Lembra  do filme censurado? 

- Conseguimos com o Braulio do cinema, uma sessão para nosso DCE, mas um infiltrado nos  dedurou e quase fomos todos presos. Tivemos que fugir pelos fundos da casa do Braulio e a cavalaria nos aguardava atirando para matar, mas da nossa turma, só o Zé Paulo se feriu, mas mesmo baleado, escapou das garras daqueles miseráveis.

- É.  O cerco está se fechando!

- E o vigário aqui da cidade está usando seus sermões para apoiar as atrocidades que estes malditos fascistas estão cometendo contra o povo e contra a nação em nome de um deus que nada tem a ver com os evangelhos.

 - A tal marcha pela família, tradição e propriedade já vem acontecendo por aqui e o pior. - Fazem o gesto do cramulhão da Alemanha.

- Então meu camarada! A resistência continua. O sangue derramado de nossos camaradas não será em vão. 

 E as aulas, na semana que vem, estão voltando. - O tempo vai fechar ainda mais.

Neste momento chegam da missa Dona Sergia e Simone e os dois mudaram de assunto.

- E aí meu irmão? - Como foi o passeio em Candeias ? - Pelo jeito foi muito bom heim! Perguntou Simone.

-Melhor não podia ser, minha irmã.

E você Augusto? - Vai ficar com a gente esta noite? - Já é tarde. - Amanhã Ângelo leva você! 

- Não, obrigado Dona Sérgia. O Bruno está vindo me buscar, é o meu cunhado, lembra?

- Sim, casado com sua irmã Tereza, aquela gata borralheira.

- Isso, ela não sai de casa para nada. gosta mesmo é de cozinhar para a peãozada, cuidar das crianças, da casa e do marido!

Nisso ouviram uma buzina. 

- Chegou, só vou pegar minha mochila.

Augusto se despediu de Simone e Dona Sergia e Ângelo o acompanhou até o portão.

- E seu pai, como está? - Perguntou Augusto. 

- Cada dia pior! -   Não liga mais para as fazendas, deixa tudo nas mão do capataz,  vive nas currutelas, nos butecos bebendo e jogando. - Ele não é diferente do seu velho.

 - Estou desconfiado que ele tem uma amante fixa , o velho  anda muito misterioso, às vezes fica o fim de semana fora de casa, mas falamos depois sobre isso-.Disse já se despedindo.

E assim, na  velha " Variant " foi embora com seu cunhado.




                                                     Fim das férias.

Naquele último domingo das férias, de manhã, Ângelo estava morrendo de saudades de sua amada, já que Joia, por conta de um compromisso não pode ir novamente com ele à Candeias. Sozinho, ele não podia ver Bia. Mas, o destino conspirou  a favor de quem ama. Ouvindo o rádio, Dona Sérgia chegou ao quarto de Ângelo.

 - Filho! - Você está sabendo? - O Convento das Irmãs Silvianas sofreu um ataque dos comunistas nesta madrugada. As irmãs nada sofreram, mas o Convento está fechado. A Madre Superiora dispensou as funcionárias e as irmãs estão sendo transferidas para a capital até que seja feita a reforma da parte que foi destruída por uma bomba caseira: a cozinha e refeitório.

- Sério, mãe! - estou indo pra lá. 

- Fazer o que lá filho?- Cuidado com estes comunistas, são perigosos! 

- O rapaz não escutou a mãe, se arrumou rapidamente, desceu , pegou o Jeep e sai apressado. Porém ao passar ao lado da estação rodoviária, viu um ônibus estacionado e uma linda moça com uma bolsa grande e uma mochila indo em direção do ponto de TAXI. Ângelo não estava acreditando no que estava vendo.

Era sua bela Beatriz. Ele se aproximou, a abraçou e a   beijou com muito carinho dizendo:

Marcamos um encontro por telepatia, é?

 - Oi amor!!! - Como sabia que eu estava voltando?

- Minha mãe ouviu a notícia no rádio e eu estava indo até Candeias quando a vi chegando.

Então. - Vim para ficar. O Convento está fechado até segunda ordem.

- Quem jogou uma bomba no mosteiro? - Por lá já sabem alguma coisa? - Então, não comente com ninguém, mas há uma suspeita que foram os jagunços dos generais.

 - Annhhhh! - Isto é muito grave,minha princesa!

- É que a Madre Superiora não se curvou ao regime e continuou denunciando as mazelas desta gente, inclusive lutando contra as desigualdades sociais e defendendo a terra para quem dela ganha o pão de cada dia  e moradia digna  a todos os mais pobres.

 As CEBs, Comunidades Eclesiais de Base,criadas pela alta cúpula da Igreja, realizava atividades religiosas em todo o país em época de quaresma, Natal, festas religiosas e sempre com discutindo temas relacionados com os direitos civis, combate à fome, mortalidade infantil e outras questões que afetavam diretamente a vida das famílias pobres e oprimidas.

Por conta disso, entrou para a lista do que eles chamam de comunista e deu no que deu.

- É mas a noticia que circula pelo rádio e TV é que os comunistas que atacaram o Convento porque são contra qualquer religião.

 - Mas vamos mudar de assunto, não é? 

- Tem espiões por todos os lados escutando tudoo que as pessoas conversam. 

- Venha! - Vamos tomar um sorvete ali na Doce Deleite, depois eu te levo em casa - assim, conheço seus pais e irmãos.

- Não precisa. Minha casa é muito simples - tenho vergonha.

- Que bobagem, meu amor!

Toamaram sorvete, curtiram os jardins da cidade e por fim, o rapaz mesmo contrariado pele moça, foi levá-la até a sua casa.

- Por ruas de terra e areia chegaram em frente a uma casa de madeira com uma cerca de balaústre , flores na frente e pomar nos fundos.

- Bem-vindo à minha humilde residência.

- Dona Geni, mãe de Bia, veio logo a recebendo com um abraço e um beijo no rosto - deus te abençoe minha filha. _ Nós aqui tava preocupado com o que aconteceu.

Ângelo, já com as mochilas de Bia nas mãos foi se aproximando - Boa tarde, dona....

- Geni - Sou a mãe de Beatriz e o senhor, quem é? - Seminarista?

- Não, mãe! - Não está reconhecendo? - É o Angelo Belafontes - me deu iuma carona até aqui.

- Ah! -Filho da Dona Sérgia - Lembro sim - Entra, não repara - É casa de pobre!

O rapaz entrou e logo Dona Geni veio da cozinha com uma xícara de café para Ângelo e também para sua filha em uma bandeja.

- Cadê o pai, o Chico, a Wanda?

- Então, eles almoçaram e foram para o torneio de futebol lá na fazenda Àgua Viva.

- Foram no caminhão do Seo Jorge! - Chico vai jogar bola no time da vila.- Respondeu Dona Geni.

- Obrigado pelo café - foi um prazer conhecer a senhora, mas é hora de eu ir pra casa.- falou Ângelo já saindo rumo ao portãozinho de madeira.

Beatria o acompanhou e ali trocaram beijos sob os olhares da Dona geni e da vizinhança que saia à rua, outros esticavam o pescoço nas janelas das casas daquela rua.

- A gente se vê logo - Te amo! - Tchau amor - Despediu-se do amor da sua vida.

- Oxente! - Você está namorando este moço rico, filha!

- Então, mãe! - Depois eu conto tudo. Preciso de um banho e vou descansar um pouco.

- Conta mesmo, filha, mas vá. - Vá tomar seu banho. - Tem comida quentinha no fogão, visse?

Beatriz foi tomar um banho, foi descansar e algumas horas depois foi acordada com a chegada do pai dela, do irmão Chiquinho e Wanda também sua irmã.

Wanda e Chiquinho foram correndo abraçar Bia, o pai também foi logo ver sua filha querida.

- Que bom que você veio sã e salva, filha. - Nós tava preocupado.

-É pai, agora vou ficar um tempo com vocês- vou para a roça também. Acabou a colheita de café?

- Não precisa filha, o Chico e eu damos conta das despesas de casa.

- Filha, eu vou com seu pai mais o Chico, filha -você cuida da casa.

- Veio, nossa filha tem uma novidade! - Ela está namorando. - Adivinha quem é o namorado dela?

- Como assim, minha filha? - É um rapaz lá de Candeias? - perguntou o pai.

- Não meu pai. Meu namorado é o Ângelo Bellafontes. 

- Aquele playboyzinho? - perguntou Chico.

- Você vai ficar rica se casar com ele - replicou a menina Wanda.

- Tenha cuidado minha filha - a família dele é rica, aquela Dona Sérgia - sabe como ela é! - falou o pai preocupado.

- Gente, não se preocupem! - Ângelo é um rapaz de bem, respeitador e cada dia mais parece me amar e eu  estou cada dia mais apaixonada por ele! - afirmou Beatriz.



Imaginando a situação de desconfiança na família de Beatriz, Ângelo fez uma visita à familia de Bia naquela semana, conversou com seus pais sobre suas intenções com a moça e avisou que teria que retornar à capital por conta da volta às aulas, mas que estaria na cidade em todos os finais de semana e viria ver a amada sempre.
A família da jovem ficou encantada com a educação e o carinho do rapaz com todos.
- Além de educado, seu namorado é lindão heim Bia. - Disse a espevitada Wanda, a caçula da família.
-Menina assanhada! - Não sabe ficar de boca calada, repreendeu a mãe, Dona Geni.




Assim, Ângelo retornou aos estudos e também às lutas do movimento estudantil contra o regime fascista instalado no país. Naquela semana apareceram na cidade, soldados armados em todos os cantos da cidade.

Os homens do regime, desta vez a cavalaria ,causavam o terror na praça onde sempre tinha pessoas conversando. E na quarta-feira a noite o Velho Eremita estava na Praça da Matriz cercado de pessoas escutando suas histórias e profecias, quando os soldados se aproximaram e já foram ordenando que se dispersassem, que fossem para suas casas, era o toque de recolher. Como muitos não obedeceram, atiraram para o alto, lamçaram bombas de gás lacrimogênio no povo, fazendo com que o Velho do sacolão saisse correndo em meio a fumaça e explosões. - Malditos !!!! - Vão queimar no fogo dos infernos!


Eram tempos de Ato Institucional, que proibia qualquer tipo de

aglomeração de pessoas para qualquer tipo de conversa e também a ordem era que todos se recolhessem antes das dez da noite.

Naquela noite, Beatriz havia saído de casa para ir a uma novena na igreja. Ao ouvir o barulho de tiros e ver fumaça na praça percebeu logo o que estava acontecendo.

A moça saiu caminhando às pressas em direção a sua casa e na avenida principal ouviu uma buzina. Ficou ainda mais apreensiva.

Era Joia, sua amiga, ou Dona Joia, como era conhecida dirigindo sua "maverick" azul.

-  Beatriz? - Entra aqui, eu te deixo em casa!- Não é seguro caminhar sozinha a noite com este caos nas ruas.

- Eita! - Que Deus existe! - Você me salvou, minha amiga! - Saudade!

- Eu também, Bia! - Que surpresa boa!

Já a caminho da casa de Bia, Joia ia lembrando dos velhos tempos em que havia 

casado com o filho mais velho dos Vacarini mesmo contra a vontade dos pais dele.

Infelizmente o marido veio a falecer fazia pouco tempo em uma briga de boteco.

- Fiquei sabendo da tragédia, amiga. Eu já estava trabalhando no Convento.- Que pena! - Sei o quanto você o amava! -

Juntos enfrentaram a família dele e se casaram.

 - Você morava na fazenda  Àgua Viva?

- Então Beatriz. -Vivemos por quatro anos lá mesmo, fazenda onde comi o páo que o diabo amassou.


 - O velho queria deserdá-lo e você sabe o motivo, né? - Velho racista!

 - Mas eu não guardo mágoas, nem rancor de ninguém. Deixo por conta da lei

do retorno.

- O que aqui fazemos, aqui pagamos.

- Colhemos somente o que plantamos neste mundo.

- Veja a situação dele hoje? - O velho está acabado, falido e virou cachaceiro dos

piores: aquele que é agressivo, acha que é o bonzão quando bebe e só arranja

tretas.

 - Perdeu o respeito que tinha quando era o segundo maior fazendeiro da região

e hoje vive apanhando que nem cachorros pelos botecos.

 - Juro que jamais desejei mal a ele, muito menos à família dele, embora tenham

me causado muitas humilhações quando eu e Lourenço nos apaixonamos.

- Conheço você, minha Joia rara! - Sei do seu bom coração. - Respondeu Bia, já em frente à sua casa.


- Entra minha amiga. - Minha família vai gostar de te ver.

- Fica para outro dia, querida! - Temos muito a conversar sobre como anda sua

vida depois de conhecer Ângelo.

- Sim, precisamos conversar muito mais.

- Que tal a gente se encontrar amanhã?

- Ótimo, Bia. Venho buscar você para conhecer minha casa na fazenda.

- Combinado! - Até lá e obrigado por ter me salvo daqueles abutres do regime.

No dia seguinte Joia mandou seu capataz ir buscar Bia para uma visita em seu sítio onde lá conversaram, trocaram idéias sobre a situação do país e também sonbre as expectativas de um iminente casamento desua amiga com o jovem estudante de medicina. 

O tempo foi passando e o amor do casal só aumentava a pnto de marcarem o noivado que foi tudo muito simples na casa de Beatriz com a presença de Joia , Simone e também do amigo Augusto que a estas alturas já aprovava o relacionamento do amigo com a plebeia Beatriz da Silva.

Dona Sergia, por incrível que pareça, não se opôs ao noivado do filho e o seu pai, o velho Julião nem se manifestou. A vida do velho era bares, bebidas, farras.

No mês de outubro, em uma visita  à família da jovem Bia, o assunto casamento foi a pauta da noite.

- Você não acha muito cedo, rapaz? - questionou o pai da moça!

- Não, Seu Bento! - Sua filha e eu nos amamos e temos certeza que é isso que queremos. Vamos  construir uma família juntos, quem sabe na capital, pois estou me formando em medicina e é lá que pretendo abrir minha clínica.

- Então meu pai, minha mãe e família! - Eu quero muito me unir a Ângelo, o amor da minha vida - não vejo motivos para adiar este casamento.

- A vida é de vocês. - Se estão com tanta certeza assim, tem a nossa bênção. Disse o pai.

E assim marcaram o casamento para o terceiro sábado de março do ano seguinte, 1970.



 O ano de 1970 estava terminando, o clima era de festas de fim de ano.

Os enfeites de Natal se viam por todos  os lados. Presépios eram montados na Matriz , nas casa e até em praças públicas e jardins das casa.

Na residência da família de Ângelo, além do clima de empolgação por conta do iminente casamento do rapaz, a mãe dele e a irmã Simone montavam um presépio com muitas latinhas de mudinhas de arroz que plantavam com antecedência.

As imagens de Maria, José e dos reis magos, desta vez foram feitas por João Pretinho , que tinha habilidade em esculturas de argila que retirava do riacho próximo à cidade. 

Ao ajeitar as estatuazinhas na mangedoura, Simone sentiu falta de ovelhinhas, vaquinhas, aves.

- Mãe, O João Pretinho esqueceu das ovelhas e outros bichos que fazem parte do presépio! João pretinho era um rapazinho que apareceu na cidade ainda criança , ninguém soube de onde veio e foi criado por um e outro morador até chegar na mansão dos bellafontes, que o acolheram com apoio do pároco da cidade. O menino cresceu e desenvolveu a habilidade da arte da escultura em argila. o jovem acabou se casando quando completou 18 anos e dona Ségia o presenteou com uma casinha simples, mas p´roximo da casa dos Bellafontes.

- Ah, filha! - Coloca os do ano passado. - Mas mãe! - Aqueles não ornam. - São de louça. - Vou agora na casa do Pretinho encomendar os bicchinhos todos de barro.

- E o menino Jesus? - Ficou bem feito? - Sim, mãe - Ficou bem feito, mas achei ele tristinho. Maria e José também - Estão com carinha de desânimo!

- É. Pode ser que quando o João fez, estava pensando na mãe e pai que ele nunca conheceu, pobrezinho

- Será que o Pretinho tem pais  vivos?. Perguntou Simone. 

-Sim, filha. - Coração de mãe não se engana. - Eu sou mãe!

Nisso ouviram um barulho de música e percussão vindo da rua. Era uma antiga folia de Reis que todos os anos visitavam as casas das famílias e pediam donativos para fazerem a Grande Festa de Santos Reis que já tinham um local, desta vez. A sede da Fazenda Água Grande à convite do Seo Sebastião, pai de Ângelo.

Do outro lado da cidade, já na estrada da Juripoca, o clima na fazenda dos, na casa da família de Augusto, tudo era tristeza e saudades.

Dona Nair e familia ainda não tinham encontrado ânimo para festejar o Natal, nem com presépio, nem com enfeites, muito menos festas regadas à banquetes dignos do imperador romano, com faziam em anos anteriores. Estavam muito preocupados com Augusto e seus sumiços misteriosos. A família, a estas alturas já sabiam do envolvimento do rapaz com as questões políticas na capital e isto fazia dele,uma presa fácil do regime.

Enquanto isso, na parte baixa da cidade, onde moravam os trabalhadores volantes - boias-frias, as ruas sem asfalto, cheias buracos causados pela enxurrada das chuvas de verão eram só alegria - crianças brincavam na chuva fina, outros escorregavam na grama molhada, tudo era alegria. Os mais velhos enchiam os botecos e as pequenas vendas que marcavam as compras de mercadorias a granel,  pesadas na balança em cima do balcão, estavam cheias.

A pinga rolava à solta. 

Tudo respirava animação, festejos , felicidade, só não em uma família, a de Bia, Beatriz da Silva, a noiva de Ângelo. É que sua mãe, Dona Geni estava muito doente.Estava com insuficiência renal grave. Estava retendo líquidos, com muito inchaço, corria risco de vida.

 - A pobrezinha até chegou a tentar tratamento na capital com ajuda de ângelo, mas não via resultados.

Seu marido, filhos e a vizinhança , ajudavam no que podiam, o padre também, até benzedeiras iam benzê-la. Faziam chás de ervas medicinais, mas o estado de saúde do Dona Geni, só piorava.

Embora ela continue triste, com a situação de sua mãe, tinha que  tocar a vida prá frente com o apoio de seu amado Ângelo que estava concluido mais um semestre de sua faculdade de Medicina. 

 O tão sonhado dia do casamento se aproximava. A repressão da ditatura seguia cada dia mais intensa. A perseguição contra estudantes, jornalistas, professores universitários, era constante e cruel.

O padre Afonso aconselhou Bia a pensar mais em seu casamento e que entregasse a saúde de sua mãe ao bom Deus. 

E assim, entre os cuidados com sua mãe e os preparativos para seu casamento, a moça foi levando a vida sempre com o carinho e cuidados do seu noivo. Só tinha um pequeno problema; no início da vida a dois teriam que morar com a família Bellafonte, pois a casa do casal na capital ainda estava em construção.

E assim chegou a semana do casório e também de alguns fatos nada agradáveis que aconteceram na cidade. Na terça-feira da semana do grande evento, uma caravan azul e branca apareceu na cidade. Homens de óculos escuros circulavam nesta caravan pelas ruas. Tinham olhares sinistros, assustadores. Na quinta-feira daquela semana, a família de Ângelo convidou o filho e a noiva para irem até Candeias , jantar em um bom restaurante para comemorarem o enlace matrimonial mais esperado da cidade. Mesmo com dona Geni ainda de cama, a moça foi com a família de Ângelo, deixando o pai e irmãos cuidando da pobre mulher que não teria nem condições de assistir ao casamento da filha, pois estava cada dia mais debilitada. 

O jantar aconteceu apesar da situação, mas quando retornaram por volta da meia noite, viram que a mansão havia sido invadida. Perceberam que as fechaduras do grande portão estava arrombado. O pai de Ângelo que naquela noite estava sóbrio, foi o primeiro a entrar em casa, a porta principal que dava para a sala de visitas estava entreaberta, logo chegou ângelo, a mãe e a irmã:

- Estas coisas nunca aconteceram por aqui, roubos, furtos! - Só pode ser estes comunistas que estão tomando conta do país quechegaram por aqui. - O padre Afonso bem que avisou. - falou Dona Sérgia, quase aos gritos!

Nisso Seo Sebastião desceu a escada que dava ao andar de cima e foi dizendo:

 - Não roubaram nada , até suas joias estã no lugar. O cofre está intacto. Mas as gavetas estão todas reviradas, muitos papeis pelo chão.

Beatriz só observava. estava sem ação. Ângelo também desceu com um semblante preocupado.

- Esta tudo bem, amor. - Não roubaram nada. - Vem, vou levar você pra casa. Disse Ângelo dirigindo-se á sua amada.

Neste momento, o telefone tocou.

- Não....não  atenda! - Gritou Ângelo. Mas era tarde. Simone já havia atendido.

- Por quê? - Não atender? Perguntou Simone.

- Quem era? - Perguntou o rapaz.

- Não disseram nada. - Ouvi somente uma voz ofegante. Mas  desligou.

- Vamos, amor. - desculpe-nos pela confusão

 - O que está acontecendo, meu amor! 

 - Mistério! - Uma casa assaltada. Nada roubaram. Mas reviraram tudo.

- Vou investigar, vamos à delegacia, amanhã. - Fica calma, amor.

- Vamos concentrar nossas energias em nosso casamento! Conversando, os noivos chegam à casa de Bia.

- Amor! - Você me promete não contar para seus pais? - Sua mãe pode piorar a saúde , se souber do que aconteceu lá em casa.

- Concordo! - Não vou contar nada. Mas , você sabe, não é? - Amanhã a cidade toda ficará sabendo.

- Vou evitar que alguém comente o assunto perto dela.

- Ângelo deu um beijo em sua noiva, se despediu e voltou para a mansão. Na volta viu a caravan verde e branca estacionada proximo ao Bar da Portuguesa.

Chegou o sábado daquele mês de março, o grande dia. A família de ângelo fez ocorrência na delegacia, mas o delegado ainda não tinha nada a esclarecer sobre o ocorrido. A noiva estava muito angustiada com a grave piora de sua mãe que naquela noite precisou ser internada na santa Casa da cidade. 

Em conversa com o noivo, no leito da mãe doente, resolveram adiar o casamento, mesmo sem o consentimento de sua mãe. Nã havia clima para a cerimônia acontecer com dona Geni naquele estado. Os pais de Ângelo, o padre Afonso e o tabelião concordaram.  Beatriz voltou logo de manhã para o hospital , sem mesmo saber do acontecimento inusitado. Naquela noite, após  Ângelo deixar Bia em casa, algo aconteceu com o rapaz. Ele não chegou em sua casa. Logo de manhã, Dona Sérgia estranhou que o filho não havia descido para o café da manhã. 

- Filha, vai acordar Ângelo, ele nunca dorme até tarde!

- Estranho, né mãe. - Vou lá chamar ele. Seo Sebastião já havia acordado cedo e partido para uma de suas fazendas, já que o casamento do filho havia cancelado.

- Mãe! Mãe! - ângelo sumiu! - Não dormiu em casa! - A cama dele está arrumada como estava ontem !

-  O quê? - Não ligou? - Não deixou nenhum bilhete?

- Vá filha! - Liga para a Nair. Será que ele foi para a Àgua Viva? 

- Será que está com Augusto?

Simone ligou para a mansão dos Vaccarinis e dona Nair a atendeu com a voz embargada. - Não, Simone! - Não. Estamos angustiados aqui também. Guto avisou que estava vindo prá cá ontem a tarde. - E até agora não chegou! ele estava em Candeias. De lá até aqui são duas horinhas!

Dona Sérgia já nervosa, tomou o telefone da filha: - Comadre Nair! - Meu Ângelim não está aí?

- Nem o Guto? - Meu Deus!

- Vamos ter calma , comadre. Haverão de dar notícias!

- A noiva de meu filho está na santa Casa com a mãe doente. - Vou ligar lá. - Dá notícias de Guto que eu dou not[icoias do meu filho!

Neste momento, Zilu foi atender a campainha e voltou com um olhar cabixbaixo.

- Dona Sérgia ! - Simone! - tentaram ligar a qui , mas só dava ocupado. Um sacristão do padre Afonso veio avisar que ligara da santa casa.

- Meu Deus! - Dona Geni morreu? - fala fia de deus! - desembucha? - Então Ângelo está lá!

A empregada confirmou a morte da mãe de Bia, balançando a cabeça .

- Filha! - Corre! - Vai até a fazenda avisar o seu pai! 

- Diga para ele voltar agora! - O Zé do TAXI te leva.

- Vou para a Santa Casa. Ângelo deve estar lá.

Simone não precisou ir até a fazenda. Aliás nem sabia em qual delas , o pai estava.

A notícia correu longe. Seo Sebastião chegou de volta e foram todos para o hospital.

O clima na Santa Casa era de tristeza e desolação. O pai de Bia estava totalmente perdido sem saber o que fazer. Bia estava falando com os médicos. Neste momento chega um agente da funerária que tinha um nome bem sugestivo "Funerária  Vá com Deus"

- Esta gente é que nem urubu. - Vá lá homem de Deus. Acerte todo o féretro com este mercenário. - Vou atrás de notícas de Ângelo!

Neste momento chega Beatriz aos prantos, abraça Dona Ségia e Simone:

-Onde está meu noivo! - Perdi minha mãezinha!

- Ângelo não está com você? - Meu Deus! - Dona Sérgia e Simone se abraçam e choram.

- Não diga a ela que Ângelo sumiu. - Ele há de aparecer. - Disse Simone baixinho no ouvido de sua mãe.

Aquele momento era de preparação do velório e sepultamento de Dona Geni.

 A família de Ângelo estava sofrendo duas vezes. Primeiramente pelo desaparecimento do filho querido e também pela situação de Beatriz que não para va de perguntar pelo noivo. Ela precisava muito do apoio dele e a famíliaresolveu inventar uma desculpa. Ângelo precisou viajar para a capital para resolver uns assuntos da faculdade e que talvez não estaria no enterro daquela que seria a sua sogra.

Em meio a toda aquela tristeza e angústia, o velório e sepultamento da dona Geni aconteceu. O dia estava nublado e ventava muito como se uma tempestade estivesse por vir e não deu outra: Mal  terminou o ritual do enterro, as pessoas tiveram que sair às pressas do cemitério pois uma forte chuva com muitos raios, trovões caía sobre a cidade. cada um se protegeu como podia e assim terminou aquele triste dia e para piora , a cidade ficou sem energia elétrica, serviço de telefone e com as estradas que davam acesso, todas interditadas por contas de muitas quedas de barreiras.

As famílias de Ângelo e também de Augusto estavam desesperadas com o sumiço dos dois rapazes. O que poderia ter acontecido com os dois?

Beatriz estava desconsolada e muito desconfiada com a ausência do noivo. Então resolveiu procurar Dona Sérgia para que esclarecesse de vez o que estava acontecendo. Desta vez, a mãe do rapaz abriu o jogo para a futura nora.

- Minha filha! - Sinto muito em informar a você que meu Ângelo está desaparecido desde aquela noite em que esteve no hospital com você.

- Alguma coisa aconteceu no seu caminho de volta.

 -Estamos desesperados. Já no dia seguinte damos queixa na policia e estão a procura dele , mas até agora não trouxeram nenhuma notícia.

Dona Joia, que esteve presente também durante a doença e falecimento da mãe de Beatriz estava preocupada com a situação da amiga, agora órfã de mãe e com o noivo desaparecido. Ofereceu , então um emprego para a família de Bia em seu sítio, pois lá, nada iria faltar a eles.

Passaram-se  mais de dois meses e nada de encontrarem vestígios do rapaz. Já sobre Augusto, a família Vaccarini preferia dizer que o mesmo deu notícias e estava na capital ocupadops com os estudos. Seria verdade?

A família de Beatriz aceitou a proposta de Joia e foram morar no Sítio Gralha Azul onde trabalhavam na produção de hortifruticultura e também de granja de onde abasteciam com frangos e ovos, o comécio çlocal era um sítio muito bem cuidado, autosustentável, com as matas ciliares preservadas, o que protegia as nascentes do Rio quilombola que corria a pocos metros da casa da patroa. Muitos animais entre lobos guarás, lagartos, jaguatiricas, tartarugas, enfim , era um verdadaeiro paraíso. Um ecossitema com muitas cachoeiras , além da presença de muitas aves como gralhas, garças, ararras, maritacas etc....

E o tempo foi passando, mais um fim de ano chegando e nada de notícias de Ângelo. Dona Sérgia vivia a base de remédios.  Seo Sebastião vivia nos botecos se embriagando como se isso trouxesse o filho de volta. Simone , a estas alturas , adiou o sonho de fazer faculdade na capital para dar um apoio aos pais , mas a jovem também sofria muito. E neste clima de angústia, vais se aproximando mais um final de ano.








Era o ano de 1971, mais um ano sombrio com muita perseguição, morte e tortura muita violência policial nas ruas, toque de recolher  após as 10h00 da noite, além de outras  proibições descabidas.  O regime  havia chegado a seu ápice. Todos os estudantes, todos os jovens, todas as pessoas que fossem contra o regime eram taxadas de inimigos da nação, comunistas e por isto eram torturados, ameaçados, mortos. Muitos artistas, intelectuais, ativistas de causas sociais como a reforma agrária, o combate a fome e a miséria que só aumentava,eram os subversivos , arruaceiros e com isto, justificavam os castigos , a violência , a morte.

O desaparecimento de pessoas continuava, o exílio também. Porém havia muita resistência por parte de um grupo de estudantes mais ousados que não temiam dar a própria vida para a libertação do país daquele terrível regime.

Muitos jornalistas, professores, músicos foram assassinados por lutarem a fovor dos mais pobres , as principais vítimas do regime. Surgiam também, as guerrilhas formadas por jovens que eram treinados para manusear armas e enfrentar a milícia do Estado.

As poucas TVs, que tinham na cidade, nem mesmo as novelas eram poupadas da censura, os jornais só mostravam o que os ditadores autorizavam. O rádio também. O programa A vóz do País era sempre às 19h00 e só apresentava notícias de interesse do regime.

Nas ruas, bares, praças, ninguém falava  mal do reguime ou comentava  sobre os desaparecimentos, sobre a violência da polícia, sobre as prisões arbitrárias. Estava proibido fazer rodinhas de conversa, havia infiltrados do regime por todos os lados.Nas escolas, onde os jovens acreditavam que tinham mais liberdade para conversar sobre aquela conjuntura política, também haviam infiltrados. Pasmem! _ Até os sermões dos padres nas igrejas eram censurados , a Igreja tinha que ser submissa ao regime e ai daqueles padres que comentassem qualquer crime ou ataque por parte dos jgunços do general.

O tempo foi passando, o regime cada vez mais sanguinário e o povo cada vez mais empobrecido. Os banqueiros e donos de multinacionais ficavam cada vez mais ricos e o pais ia se endividando.

 

Na cidade de Vulcânia, por ser pequena e distante dos grandes centros , nem tudo afetava. Apenas a carestia e a exploração do trabaho dos boias-frias eram sentidos.

Uma família toda, colhia café durante um dia e o que ganhavam, mal dava para comprar o mínimo para comer. A mortalidade infantil aumentava e doenças como sarampo, coqueluxe, catapora, varicela, além da esquistossomose, matava muita gente, principalmente crianças. As que sobreviviam ficavam com sequelas.Nã havia política pública de vacinação e controle destas doenças porque o regime era negacionista. negava a eficácia da vacina e ainda disseminava falsas informações como " A vacina tranforma pessoas em demônios". Não comprem vacina. todas estas doenças são curadas com "querubina". O próprio presidente aparecia na TV dizendo que a tal querubina era indicada pelo tal deus da seita que ele pregava pelo país inteiro. Mas muitos que caiam nesta mentira, comprava o tal remédio e morriam de insuficiência cardíaca, derrame cerebral e outras sequelas. Enquanto isso o farmacêutico que criou a tal fórmula só enriquecia e repassava uma porcentagem dos lucros para o filho do presidente corrupto e autoritário daquele cruel regime.

E este contexto de desinformação, censura da imprensa e perseguição a qualquer um que ousasse criticar este desgoverno, com a ausência do Estado de Direito, as pessoas viviam amedrontadas e intimidadas na cidade de Vulcânia e em todo o país. O desaparecimento de Ângelo e seu amigo Augusto continuava era  um mistério e as pessoas nem podiam comentar sobre o assunto.

A família de Angelo sofria calada e isto levou Dona Sérgia, a piorar sua doença  dos nervos e o pai, Seo Sebastião, cada dia mais  desorientado passou a bebermais e mais  e arranjar encrencas nos botecos. Simone, a jovem irmã de Angelo que mesmo fragilizada e sofrendo cuidava da mãe , já que do pai perdera o controle. A fazenda Água Grande continuava produzindo muito café e algodão, gerando lucros cada vez mais altos, graças à honestidade e dedicação do capataz que sempre foi fiel aos patrões.

Já a fazenda Àgua Viva, da família de Augusto, após seu sumiço, passou a acumular prejuízos. O gado, por falta de cuidado passou a adoecer com a febre aftosa, a produção de leite e seus derivados despencou e as dívidas no banco só aumentavam. Já na década de 1970, um dos generais que comandavam o regime, implantou um programa de subsídios `agricultura que tinha como lema: " Plante que o governo garante" 

O pai de Augusto, assim como diversos fazendeiros da região se empolgaram e fizeram financiamentos para investir na produção de suas terras, na tentativa de salvar suas fazendas da falência, mas na mudança de governo, tudo veio a desmoronar. As dívidas venceram, a colheita rendeu, mas os preços do café e do algodão, assim como do leite e carne bovina, despencaram no mercado exportador e os juros dos financiamentos feitos subiram, levando à falência muitos sitiantes e latifundiários. 

A situação só veio a piorar pois maioria das terras ficaram abandonadas, não havia condições para cultivo da terra e plantio de nova safra e assim muitas famílas tiveram que migrar para as cidades em um momento que os boias-frias também ficaram sem trabalho. 

A fome reinava, crianças morriam de desnutrição, pessoas adoeciam por não se alementarem como deviam , os postos de saúde viviam cheios, mas só atendiam quem tinha a tal carteirnha do INPS, comprovando que contribuiam mensalmente. Aos pobres e desempregados só restava a caridade das pessoas e das entidades filantrópicas religiosas.

A Irmandade Mulheres Virtuosas de Maria Imaculada, da qual participava Dona Sérgia, vivia cheia de pessoas pedindo um kg de feijão, um arroz, um leite para as crianças, uma bolacha, mas nem sempre conseguiam, pois após a doença da  fundadora,as doações cairam muito e a Prefeitura, alegando falta de recursos, deixou de contribuir com a entidade.

A família de Bia, continuava morando no Sítio de Dona Joia , porém Beatriz retornou para Candeias com a reabertura do Convento das Irmãs Silvianas e sempre que podia vinha visitar o pai, que não se casou de novo, a irmã e o irmão no Sítio da sua melhor amiga dona Joia. Bia não era mais a mesma, a mora era a cara da melancolia, da tristeza, da desesperança. Ela jamais aceitou o que o destino preparou para ela.

Bia trabalhava na cozinha onde ajudava a preparar as refeições das freiras e também cuidava da horta e da pequena criação de cabras que forneciam o saboroso leite servido no café da manhã no convento. Como ela tinha moradia, comida e até roupas, não tinha grandes despesas ecom  seu salário, sempre que podia  trazia , alimentos,  roupas, caçados  de Candeias para sua família e ainda ajudava a pagar contas de luz e água encanada, uma novidade que chegara ao bairro onde seus pais moravam.

 

Mais um Natal se aproximava na  era das discotecas. A chamada era Disco e as pessoas, ao menos as mais abastadas só pensavam em dançar, dançar e dançar estimulados por uma novela, a " Dancin' days" transmitida por um importante canal de TV. Era o dance, dance, dance.

A ordem era " Abra as suas asas, solte as suas feras, caia na gandaia, entre nesta festa". Desde que não questinasse o regime , dançar, era permitido. 

Embalados pela onda das discotecas, a música popular brasileira  era deixada em segundo plano, era brega. Chique mesmo era curtir a música importada dos "States", da Europa", da civilização. Donnna Summer, Bee gees, Olivia Newton John, Roberta Kelly , Tina Charles e bandas com Boney M., Santa Esmeralda, entre outras ditavam o que era moda. E neste clima de alegria ,nossa heroina Beatriz, a Bia desembarca na rodoviária da cidade para visitar a sua familia.

A cidade estava cheia de luzes de Natal e a igreja matris toda cheia de lâmpadas coloridas na fachada.

Ouvia-se por todos os lados o Noite Feliz e muitas outras rezas e novenas de Natal. No coreto da pracinha da igreja , algo chamava a atenção: depois de muito tempo o velho ermitão das montanhas deu o sinal de sua graça. O povo se juntava para ouvir suas profecias e devaneios. Bia resolveu parar por lá para também escutar o que o pai da mata tinha a dizer. 

De repente , todos começaram a gritar e correr sem rumo após ouvirem os estampidos de vários tiros em meio as árvores próximas ao coreto.

- Deus me defenda! - Gritou Bia, apavorada.

 Os homens do regime, desta vez, a cavalaria causou o terror na praça para que o povo se dispersasse.

Eram tempos de Decreto Institucional do regime que proibia qualquer tipo de

ajuntamento de pessoas para qualquer tipo de conversa. Entre bombas de gás

lacrimogênio, tiros para cima e ameaça de jogar os cavalos em cima das pessoas, o que

para eles era um motim, acabou.

Bia caminhava apressadamente e na avenida principal ouviu uma buzina e ao olhar viu que

era Joia, sua amiga, ou Dona Joia, como era conhecida dirigindo sua perua Rural Willys

- Calma, amiga! - Entra aqui, eu te deixo em casa!

- Eita! - Que Deus existe! - Você me salvou, minha amiga! - Saudade!

- Eu também, Bia! - Que surpresa boa!

Já a caminho da casa de Bia, Joia ia lembrando dos velhos tempos do seu casamento com o filho mais velho da família Vaccarini, mesmo contra a vontade dos pais do rapaz.

Infelizmente o marido veio a falecer, vítima de homicídio, em uma briga de boteco.

- Fiquei sabendo da tragédia, amiga. - Que pena! - Sei o quanto você o amava! -

Juntos enfrentaram a família dele e se casaram.

-  Você morava na fazenda Àgua Viva?

- Então, Beatriz. Vivemos todos aqueles  anos lá mesmo, fazenda em que o pai

deixou para ele após muita encrenca.

-  O velho queria deserdá-lo e você sabe o motivo, né? - Velho racista!

-  Mas eu não guardo mágoas, nem rancor de ninguém. Deixo por conta da lei

do retorno.

- O que aqui fazemos, aqui pagamos.

- Colhemos somente o que plantamos neste mundo.

- Veja a situação dele hoje? - O velho está acabado, falido e virou cachaceiro dos

piores: aquele que é agressivo, acha que é o bonzão quando bebe e só arranja

tretas.

 - Perdeu o respeito que tinha quando era o segundo maior fazendeiro da região

e hoje vive apanhando que nem cachorros pelos botecos.

 - Juro que jamais desejei mal a ele, muito menos à família dele, embora tenham

me causado muitas humilhações quando eu e Lourenço nos apaixonamos. Ele e a sogra chegaram a querer me obrigar a me vestir de preto pelo resto da minha vida em luto pela morte do meu marido. na verdade, esta gente é racista, nunca me aceitaram como nora por conta da cor da minha pele. Eles me aturavam, nunca me respeitaram e sempre que davam festas queriam que eu fosse a cozinheira, a faxineira, aquela que iria servir os convidados. Nunca me aceitaram como da família. Viviam me pedindo para lhes servir uma água, um café, mas eu nunca acietei esta condição por ser negra. Me recusava a este papel. isto deixava eles , enfurecidos. nunca fui submissa nem ao meu marido, que deus o tenha. Mas não guardo mágoa. O problemasempre foi deles, não meu.

- Conheço você minha Joia. Sei do seu bom coração - respondeu Bia, já chegando no sítio.

- Sei também que eles nunca engoliram o fato de você ser a única mulher nesta cidade que dirige qualquer condução e até tratores na lida da fazenda.

- Ah, sim, Bia. Meu sogro vivia dizendo que dirigir carros e até trator na roça não é coisa para mulher. - Bando de gente atrasada e ignorante!

E assim, chegaram à casa da fam´milia de Beatriz;



-Assim que puder, vá lá em casa! - Temos muito a conversar sobre como anda sua

vida depois do desaparecimento de Ângelo.

- Sim, precisamos conversar muito mais.

- Que tal a gente se encontrar amanhã?

- Ótimo, Bia. Amanhã. - Vem almoçar comigo?

- Combinado.

- Obrigado pela carona e por ter me protegido daqueles abutres. - Respondeu Beatriz.





O almoço na casa da amiga Joia.


No dia seguinte, por volta de 11h00 da manhã Jóia chega até a casa de Bia para levá-la até sua cas como haviam combinado. A irmã  de Bia a convidou para entrar, tomar um café e assim a jovem viúva o fez. Conversou um pouco, falou da situaçõ difícil em que o país se encontrava , ofereceu ajuda à familia de Bia, caso precisasse.  

- As coisas estão difíceis para todos , mas dou graçãs a Deus por meu falecido Lourenço. - Era tão novo ainda, para mim era o melhor homem do mundo, sempre carinhoso, amável, nem parecia ter sido educado por aquela gente !( lágrimas começaram a molharem suas negras faces) 

- Fica assim não companheira amiga. - Deus sabe de todas as coisas. 

 Bia e sua irmã, abraçaram  a velha amiga de todas as horas, dando a ela, o conforto. 

E assim, mais tarde , Beatriz  sencontra-se na casa de joia à mesa do almoço. Joia, embora tenha ficado com a fazenda que era do marido e mais alguns imóveis de aluguel em Candeias, cidade maior da região, não ostentava luxos. Não tinha empregada. Tinha apenas uma família de empregados mais antigos que cuidavam do gado leiteiro, da pequena criação de porcos e galinhas. E também, as vezes davam uma ajuda nos afazeres domésticos e limpeza da casa grande, a residência de Dona Joia. 

- E então Beatriz, como está sua vida? - Me conta! - Você está naquele convento a trabalho, a passeio ou quer mesmo ser freira? 

- Passeio ?-  Riu a moç! - Estou lá há  quase dois anos. Em princípio eu tinha a iluisão que seria freira sim, iria ser noiva de Jesus, de mais ninguém. - Mas acabei me convencendo que mesmo com Ângelo desaparecido há muitos anos, eu ainda tenho esperança que esteja vivo ,que alguma coisa muito estranha tenha  acontecido naquele fatídico dia. Nã é possível servir a Jesus como freira com o coração partido de paixão não por Cristo, mas pelo Angelo, o grande amor da minha vida. Então,   a Madre Superiora me propôs que ficasse ajudando na cozinha, na horta, na lida com as cabras, enfim, lá faço de tudo ,um pouco. E assim vou tocando minha vida!

- Lá, tenho comida, pousada ,roupa e um salário que é pouco, mascomo não tenho despesas, de vez em quando eu ajudo minha família e ainda faço um pé-de-meia. Guardo umas economias na caderneta de poupança da CAIXA Econômica Federal.

Quanto ao meu Angelo? - Jamais vou esquecê- lo e tenho certeza que ele jamais me deixaria plantada na Igreja, vestida de noiva esperando por ele no dia que seria o mais feliz de nossas vidas, se algo muito grave não tivesse acontecido. 

E eu ainda haverei de descobrir. Haverei de encontrá-lo um dia, mesmo que já velhinho, com sequelas de alguma violência que sofreu, mas hei de entender tudo o que houve e dar a ele todo o meu amor. Acredito que o desaparecimento de meu amor e do seua amigo Augusto tem tudo a ver com perseguição política porque eu soube que eles faziam parte do movimento estudantil na capital e participavam de paseatas de protesto contra o maldito governo.

Bia estava visivelmente emocionada , seus olhos lacrimejavam. 

- Conta sempre comigo, Beatriz. - Fala mais. Desabafa. - Estou aqui para ouvir suas lamentações, tristezas, mas também sei de suas vitórias, suas conquistas, suas lutas, sua fé. - Você é uma guerreira. eu também concordo com você. Ângelo e Augusto foram vítimas destes abutres que deram o golpe de Estado neste país e só trouxeram desgraça, violência, miséria e morte! Até quando vamos suportar estes criminosos que tomaram o poder e desfilam pelo país ostentando as cores de nossa bandeira e usando o nome de Deus para justificar suas atrocidades?

- Mas somos fortes, amiga joia! Estes urubus estão com os dias contados. Não há mal que dure. Já existe um movimento que está crescendo com apoio da Igreja católica e das CEBS, Comunidades Eclesias de base que está abrindo os olhos do povo. AS tais campanhas da Fraternidade estão mobilizando famílis católicas de norte a sul do Brasil despertando a consciência do povo trabalhador sobre seus direitos civis utilizando os evangelhos de Jesus Cristo.

- Você anda muito bem informada, Bia. Com o apoio da Igreja, este desgoverno nefasto e mentiroso já dá sinais de  autodestrição e a verdade está vindo à tona.

- Mas,e você ? - Como se sente com o misterioso sumiço de Ângelo?

  - De certa forma, me sinto viúva, de marido desaparecido. E você, viúva de marido morto e da pior forma: assassinado.  -  Precisamos unir forças, pedir a Deus muita coragem e disposição para viver um dia de cada vez.

As duas se abraçam e choraram juntas! 

- Seu almpço está uma delícia, mas me descuplpe - não consigo comer bem quando estou saudosa, triste , deprimida. Estou com muita lágrima presa na garganta, Faço muitas perguntas que nunca tenho respostas. Mas preciso me agarra a qualquer fio de esperança par que eu consiga viver .

- Entendo, Bia! - Você reparou que eu também só belisquei? - diss Joaninha, ou Joia como é conhecida. -Tudo isso que aconteceu com a gente, é muito triste!

No dia seguinte, por volta de 11h00 da manhã Jóia chega até a casa de Bia para levá-la até sua casa como haviam combinado. A mãe de Bia a convidou para entrar, tomar um café e assim a jovem viúva o fez. Conversou um pouco, falou da situaçõ difícil em que o país se encontrava , ofereceu ajuda à familia de Bia, caso precisasse.  

- As coisas estão difíceis para todos , mas dou graçãs a Deus por meu falecido Lourenço. - Era tão novo ainda, para mim era o melhor homem do mundo, sempre carinhoso, amável.......( lágrimas começaram a molharem suas negras faces) 

- Fica assim não companheira amiga. - Deus proverá.  

Falaram  juntas Bia e sua mãe, abraçando a velha amiga de todas as horas. 

E assim, mais tarde , Beatriz  sencontra-se na casa de joia à mesa do almoço. Jpoia, embora tenha ficado com a fazenda que era do marido e mais alguns imóveis de aluguel em Candeias, cidade maior da região, não ostentava luxos. Não tinha empregada. Tinha apenas uma família de empregados mais antigos que cuidavam do gado leiteiro, da pequena criação de porcos e galinhas. E também, as vezes davam uma ajuda nos afazeres domésticos e limpeza da casa grande, a residência de Dona Joia. 

- E então Beatriz, como está sua vida? - Me conta! - Você está naquele convento a trabalho, a paseio ou quer mesmo ser freira? 

- Passeio ?-  Riu a moça- estou lá a quase dois anos. Em princípio eu tinha a iluisão que seria freira sim, iria ser noiva de Jesus, de mais ninguém. - Mas acabei me convencendo que mesm com ANgelo desaparecido há muitos anos, eu ainda tenho esperança que esteja vivo - que alhguma coisa muito estranha havia acontecido naquele fatídico dia. Nã é possível servir a Jesus como freira com o coração partido de paixão não por Cisto, mas pelo Angelo. Então  a madre superiora me propôs que ficasse ajudando na cozinha, na horta, na lida com as cabras, enfim, pau para toda obra. 

- Lá, tenho comida, pousada ,roupa e um salário que é pouco ,msas de vez em quansdo eu ajudo minha família. 

Quanto ao meu Angelo? - Jamais vou esquecê- lo e tenho certeza que ele jamais me deixaria plantada na Igreja, vestida de noiva esperando por ele no dia que seria o mais feliz de nossas vidas, se algo muito grave não tivesse acontecido. 

E eu ainda haverei de descobrir. Haverei de encontrá-lo um dia, mesmo que já velhinho, com sequelas de alguma violência que sofreu, mas hei de entender tudo o que houve e dar a ele todo o meu amor. 

Bia estava visivelmente emocionada , seus olhos lacrimejavam. 

- Conta sempre comigo, Beatriz. - Fala mais. Desabafa. - Estou aqui para ouvir suas lamentações, tristezas, mas também sei de suas vitórias, suas conquistas, suas lutas, sua fé. - Você é uma gurreira. 

- Somos fortes.  - De certa forma, me sinto viúva, de marido desaparecido. E você, viúva de marido morto e da pior forma: assassinado.  -  Precisamos unir forças, pedir a Deus muita coragem e disposição. 

As duas se abraçam e choram juntas! 

- Seu almoço está uma delícia, mas desculpe-me - não consigo comer bem quando estou saudosa, triste , deprimida, mas sem perder a esperança, claro.. 

- Entendo, Bia! - Você reparou que só belisquei? - diz Joaninha, ou Joia como é conhecida. 


Mistérios nas madrugadas de Vulcânia.


O desaparecimento de Ângelo e de Augusto desencadeou muitas especulações, lendas e até profecias na cidade. Uma das lendas era sobre a aparição de um cavaleiro vestido de preto trazendo um livro de uma lado dos arreios esegundo alguns que juravam ter visto, vestia-se como um soldado do império romano ou como Dom Quixote de La Mancha, porém sem o seu escudeiro Sancho Pança.

O cavalo era branco e em noites de lua cheia, galopava pelas ruas da cidade fazendo com que os cachorros latissem a madrugada toda. Alguns saíam em suas janelas e viam um lobisomem, um homem corcunda, todo peludo com orelhas de lobo correndo pelas ruas de quatros patas.

Outros afirmavam ver em seus quintais, um homem com uma velha túnica e uma grande capa , com cabelos e barbas enormes, roubando roupas dos varais e quando alguém acendia as luzes , o vulto pulava o muro e desaparecia seguido pelos cachorros latindo rua a fora.

Estas histórias corriam de boca em boca nos bares, nas ruas, casas e também nas escolas. As crianças não saiam mais a noite para brincar nas ruas. Os pais não deixavam com medo destes seres misteriosos. Embora , segundo corria a boca grande, eles apreciam sempre depois da meia noite e sempre em semanas de lua cheia. 

Seria tudo isso fruto da imaginação do povo? 

Nas missas dominicais, o padre Afonso pedia para que o povo rezasse mais e que colocassem pequenas cruzes de madeira em suas postas, além de queimar palhas de alho secas em suas residencias como uma forma de espantar vampiros, lobisomens e outros seres sobrenaturais.

Será que Vulcânia estaria infestada de fantasmas , espíritos malignos e feiticeiros? Estaria acontecendo na cidade ,um Congresso de entidades do além?

Os anos iam passando e oenigma ia aumentando. O desaparecimento dos rapazes parece que ia aos poucos caindo no esquecimento.

No país as lutas contra o regime também ia se intensificando. nas grandes cidades e nas capitais dos estados as ruas vinham sendo tomadas por estudantes, jornalistas, famílias de todas as classes sociais , protestando contra a ditadura instalada, exigindo a Anistia dos exilidos , presos políticos e eleições diretas para a presidência da república, Governadores, Câmaras federais , estaduais, municipais, senado e sem o voto de cabresto. Alguns menos esclarecidos iam para as ruas defender o regime da ditadura porque segundo eles, somente o regime era capaz de proteger a família, a tradição, a moral cristã e acima de tudo, a propriedade privada.



A aparição da mendiga misteriosa.


Era uma sexta-feira , semana terminando  cheia de mistérios naquela cidade quando as crianças brincavam na rua,quando viram uma sehora negra vestida com farrapos e com os cabelos crespos grandes e sujos deitada à sombra de uma árvore. João Pretinho, amiguinho de Chico, irmão de Bia, que estava por ali, aproximou-se da enigmática senhora e observou que a mesma dormia, aliás, roncava como se estivesse em um sono profundo. Ela trazia consigo um embornal grande e encardido, cheio de panelas e alguns mantimentos e uma velha Bíblia no colo.. A molecada curiosa foi se aproximando e com o barulho que fizeram, a pobre senhora acordou. - Quem é a senhora? - De onde está vindo? - Perguntou João Pretinho.

Com a cara amassada e empoeirada, a mendiga foi se levantando e com um ar de constrangida, olhos cabisbaixo, mas muito serena, respondeu:

- Meu nome é Lucinda Martins, não me lembro de onde vim, mas Deus me mandou para uma missão nesta cidade.

- Que missão é esta, senhora? - Como assim? - Interrogou o rapaz.

- A missão só o pai eterno é que sabe, o senhor pode me dar um copo de água?

João Pretinho foi buscar água e enquanto isso as crianças ficaram em volta da velha senhora que começou a contar uma história meio sem pé nem cabeça, mas que chamou a atenção das crianças. A história era sobre um tal de Pai do Mato e de uma tal de Mãe da Lua. Quando João Pretinho chegou com a água, aliás aproveitou para trazer um pedaço de pão caseiro e uma caneca de café, as crianças estavam sentadasno chão escutando a velha senhora.

A notícia se espalhou e todos queriam ver a tal de Lucinda Martins que além das histórias que contava, pedia sempre algum bocado de arroz, feijão, bolacha, pão, enfim, a senhora misteriosa se recusava a comer pratos já prontos que a ela ofereciam. Ela preferia fazer um fogão de tijolos velho e com gravetos secos que ascendia com um velho binga ( isqueiro) improvisava suas refeições. Uns e outros ofereciam a ela, banhos e pousada, também roupas novas, mas ela se recusava. Dizia que quando queria tomar banho, procurava um riacho e que não precisava de roupas novas. Preferia vestir aqueles velhos farrapos bem surrados e bastante sujos.

 

 

O contador de histórias.

Além da mendinga Lucinda Martins, apareceu na cidade ,em uma sexta-feira ao anoitecer, um velho senhor de barbas bem compridas, grisalhas e com cabelos também compridos. Vestia uma camisa de listas azul clara na vertical, calças na cor preta e usava sapatos marrons. O velho não estava sujo, pelo contrário ,atém muito bem limpo com cabelos e barba penteados. Trazia consigo uma mala de fibra  meio surrada, um outro saco com uma viola e umas canecas de aluminio penduradas. Tinha um olhar doce como o Papai Noel. Sua primeira aparição foi no Pátio da Matriz, praçã que tinha um chafariz e ltambém um coreto. Zé Pretinho foi o primeiro a vê-lo e que também se aproximou para conhecê-lo, saber de onde vinha e se precisava de alguma coisa.

As crianças que saiam da escola foram também se aproximando com muita curiosidade. O velho disse a Zé Pretinho que era contador de histórias e que também ensinava quem não sabia ler e escrever. - Mas o senhor não disse o seu seu nome e nem de onde veio. _ Insistiu Zé. - Pode me cjhamar de Mestre Vitalino. _ Vim das bandas do sertão. 

- Sou um andarilho. Minha casa é onde me dão um canto pra descansar os ossos, um prato de comida, uma xícara de café, mas só quando estou com fome e muito cansado.

Além das crianças , muitos adultos paravam para escutar o velho que logo tirou do saco, a viola e começou a cantar e tocar uns repentes que pareciam reizados do nordeste brasileiro.

" A horta de Jesus

achei muito bem plantada

A horta de Jesus, achei muito bem plantada.

O pouco com Deus é muito, o muito sem Deus é nada....

O som da viola , mais a voz rouca , mas bem afinada do velho ia chamando a atenção de muito mais pessoas. Até algumas beatas que iam para a igreja, sentaram ali por perto para apreciar as cantigas do velho que parecia ter muita sabedoria.

Entre uma moda e outra, as horas iam passando.

- O que o Senhor traz nesta mala? - Parece um baú ou é mala mesmo? - perguntou uma menina com muita curiosidade.

- Trago histórias, muitas narrativas que vem dos tempos antigos.

- Conta história pra nóis! - Pediu a menina. -Conta. Conta. vários outros meninos, meninas e até adultos pediam.

- Conto sim. - Vocês querem de Bruxas ou de fadas? 

- De bruxos, depois de princesas, fadas, monstros, gigantes. - Vozes de crianças iam sugerindo.

- Mas desse jeito, vamos ficar aqui a noite toda! - Vocês precisam dormir.

Muitas mães vinham procurar seus filhos e acabavam ficando para escutar as prosas do mestre que começou contando a história do Aprendiz de feiticeiro. Ele abriu a mala e mostrou que tinha muito mais jhistórias encantadoras. Mesmo sabendo de cor, fazia questão de mostrar os velhos livros cheios de ilustraçõ




O cavaleiro medieval.

Como se não bastasse os seres misteriosos que apareceram na cidade, certa noite de domingo,logo após a missa das 8, surgiu na avenida um cavaleiro vestido com armaduras em um belo cavalo branco . Tinha no lado direito uma espada e no ombro esquerdo, uma bandeira branca com uma grande cruz vermelha ao centro. Todos ficaram espantados com a figura daquele jovem de cabelos compridos galopando pela avenida principal. o cavalo estava todo bem equipado com arreios dourados e muitas argolas prateadas em forma de correntes no pescoço e ao lado das orelhas. alguns curiosos o seguiram de carro, outros a pé correndo par ver mais de perto o misterioso soldado de cristo. Quando chegou no fim da avenida, saída da cidade, o jovem deu meia volta e retornou, desta vez , trotando e observando o povo que saia nas janelas, calçadas, botecos , porém sem dizer uma palavra. Ao chegar na Praça da Igreja , o homem puchou o freio, seu cavalo parou, ele desceu, pegou as rédeas do animal e amarrou no tronde uma árvore. As beatas da cidade já espalhavam na vizinhança que o anjo do apocalipse acabava de chegar à cidade. Em poco tempo, a praça estava lotada de mulheres, homens e crianças que se acotovelavam para ver mais de perto, aquele ser enigmático. Sem dar muita atenção ao povo, o homem se dirigiu ao coreto da praça e finalmente começou a fazer um discurso em uma língua que ningùem entendia. Dona Sergia correu até a casa do Padre Afonso e foi logo perguntando se ele entendia a lígua dos anjos.

- Que besteira é essa Dona Sérgia? - Que alvoroço é este aí na praça?

- O senhor nã está sabendo, padre? - Um dos anjos do apoacalipse está na praça fazendo uma pregação em uma língua que só o reverendo deve conhecer. Não sei se é latim, hebraico ou aramaico. vem comigo ,padre! - Ele deve estar trazendo uma mensagem muito importante sobre o fim dos tempos.

O padre resolveu ir até a praça ver o que estava acontecendo e quem sabe, entender o que este jovem estava a dizer, mas quando se aproximou do coreto, o cavaleiro se calou. _ Quem é você rapaz? - Por que está vestido como um soldado romano? - O que tem a nos dizer? - De onde você veio? - Que língua você fala? 

- Vamos homem? - Responda?

- O jovem apenas olhava bem firme para o padre, mas não dizia uma só palavra.  Permanceu calado por alguns minutos enquanto o velho pároco insistia com suas indagações. De repente, o rapaz puxou sua espada e com uma mão a ergueu. Com a outra levantou sua bandeira e neste momento o povo ouviu som de trombetas. Com medo de ser um anúncio do armagedom, o povo foi dispersando, cada um correndo para suas casas, inclusive Dona Sérgia e o sacerdote. O moço desceu do coreto, apeou em seu cavalo branco e saiu em disparada pela avenida galopando , galopando sentido a saída da cidade até desaparecer completamente. Apesar do medo que tudo aquilo causou na cidade, o dia seguinte amanheceu como se nada tivesse acontecido e nada mudou na rotina da cidade.


Atentado à casa paroquial.

O desaparecimento de pessoas, com aconteceu com Angelo e Augusto continuava acontecendo. O delegado da cidade, nada investigava. Quando alguém perguntava, a polícia dizia que só desaparecia bandidos, vagabundos, subversivos e que sem eles o país ficaria mais seguro. E que este era um assunto do governo, portanto, estava proibido qualquer comentário sobre isto. Mas a pressão popular aumentava e até Padre Afonso foi obrigado a falar sobre estes fatos em sua homilia. Isto incomodou os agentes do regime. talvez, por consequência da manifestação do padre , a casa Paroquial sofreu um ataque em uma noite de sexta-feira por volta das duas da madrugada. Acidade foi acordada com uma grande explosão que destruiu a casa inteira e o fogo acabou com tudo que havia de móveis, objetos sacros, arquivos etc.....

Ninguém ficou ferido porqu naquela noite, o padre e dois seminaristas que lá moravam, estavam em missão na cidade vizinha.



Incêndio na casa do delegado.

Conhecido como Dr. Jacinto, o delegado da cidade era recém-nomeado pelo regime.Conhecido pela intolerância com os opositores daquele governo fascista, estava sempre circulando pelas ruas da cidade em uma caravan verde e branca. Passava em frente aos bares, às praças sempre à noite com olhar intimidador fazendo com que o toque de recolher a partir das 22h00 fosse cumprido. Ai daquele que insistisse em desobedecer. Era abordado e ali mesmo onde estava levava coronhdas , chutes e até chibatadas. A borracha comia à solta!



Profecias sobre o Vulcão adormecido e o Armagedom.




A descoberta do Ermitão.

 mãos do Senho, mas é preciso se converter!

- Bom dia, Senhoras. Tenho minha religião, participo diariamente dela em comunhão com a Irmandade, pratico a caridade, o amor ao próximo e sou convertida desde criança quando fui batizada, portanto é melhor que as senhoras procurem pessoas desamparadas, desorientadas , perdidas nos vícios e na fornicação da luxúria ou da prostituição para doutriná-las na sua crença. E agora , me dão licença que estou atrasada para um importante compromisso. E assim foi dando ré em seu Jeep e saiu levantando poeira.

Enquanto isso, na casa dos Vaccarinis, Angelo já pronto, tomava café com sua família. Sua mãe, curiosa ,perguntou:

- Então hoje tu vais com a gente na missa, filho! - Vejo que estais pronto.

- Não, mãe, vou em Candeias e talvez eu só volto no fim da tarde.

- Mas você nem preparou o carro, rapaz! - Ou vai de carona com este teu amigo grudento, o tal de Augusto - perguntou seu pai.

- Vou de carona sim, pai, mas não é com Augusto.- Vou com Dona Joia no carro dela.

- O quê? - Retrucaram ao mesmo tempo, seu pai, sua mãe e Simone, sua irmã Simone.

- Você vai para Candeias de carona com a viúva negra? - Replicou sua mão com ironia.

- Vê lá em rapaz. - Você pode ser a próxima vítima da marafona - disse seu pai em tom de brincadeira.

- Gente, vocês não estão vendo que Jóia está apenas sendo alcoviteira de alguma sirigaita para um encontro com Angelo?

- Vocês não tem jeito. Deixa o maninho ser feliz?



Nisso, ouviram a campainha. Era  Joia que havia chegado e chamava pelo rapaz?

_ Ela vai dirigindo aquela joça? - Vê lá em filho. - Mulher no volante,.... já viu - Ah- Cuidado com a língua do povo! - Fica andando por aí com esta mulher, fica! - Depois não diga que não avisei. Esbravejou sua mãe.

- Porque vocês não vão logo para a missa? - Já estão atrasados - O padre vai ralahar com vocês. - Deixem-me em paz. - Sei o que estou fazendo, tchauuuu.




















A paixão, namoro e aceitação da família.



As idas e voltas de Ângelo da capital onde estudava. 


O envolvimento de Augusto e Angelo com o movimento estudantil.


A perseguição, os mistérios da procura de Angelo e Augusto..


Os homens da Caravan Azul.



O dia do casamento.



Mistérios antecedem o dia.....



O desaparecimento.....



O casamento que não aconteceu....

O drama da noiva.







O ano de 1967 estava terminando, o clima era de festas de fim de ano. Os enfeites de Natal se viam por todos




Romarias, milagres, promessas....


 A grande revelação.


Nada mais será como antes.


Epílogo!


Agradecimentos aos leitores do Blog.💔💓💕










 

 


 







 















                        




                    



                   







        






            









                        

 

 





 

 

 

 

 

 

 







 

 

 

 

 


 

 

 


 



 

 

 

 

 

 

 


 

 

 

 

 

 


 

 





 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 


 


 


 

 

Mistérios antecedem o dia..... O ano de 1967 estava terminando, o clima era de festas de fim de ano. Os enfeites de Natal se viam por todos  os lados. Presépios eram montados na Matriz , nas casa e até em praçãs públicas e jardins das casa.

Na  residência da família de Angelo, apesar do clima de tristeza por conta do desaparecimento do rapaz, a mãe e a iermão montavam um presépio com muitas latinhas de mudinhas de arroz que plantavam com antecedência. A s imagens de Maria, José e dos reis magos, desta vez foram feitas por  João Pretinho , que tinha habilidade em esculturas de argila que retirava do riacho próximo à cidade. 

Ao ajeitar as estatuazinhas na mangedoura, Simone sentiu falta de ovelhinhas, vaquinhas, aves., 

- Mãe, O João pretinho esqueceu das ovelhas e outros bichos que fazem parte do presépio!

- Ah, filha ....coloca os do ano passado.....- Mas mãe! - Aqueles não ornam - são de louça.....- vou agora na casa do Pretinho encomendar os bicchinhos todos de barro...

- E o menino Jesus? - Ficou bem feito? - sim, mãe - ficou bem feito, mas achei ele tristinho.....Maria e José també - estão com carinha de desânimo........

- É, pode ser que quando o João fez, estava pensando no nosso Angelo que só Deus sabe o que aconteceu....- mas tenho fé em Deus - filha.

- Nosso Angelo está vivo. - Coração de mãe não se engana.

Nisso ouviram um barulho de música e percussão vindo da rua. Era uma antiga folia de Reis que todos os anos visitavam as casas das famílias e pediam donativos para fazerem a Grande Festa de Santos Reis que já tinham um local, desta vez. A sede da Fazenda Água Grande à convite do pai de Angelo.

Do outro lado da cidade, já na estrada da Juripoca, o clima na fazenda dos ......, na casa da família de Augusto, tudo era tristeza e saudades...

Dona ........e familia ainda não tinham encontrado ânimo para festejar o Natal, nem com presépio, nem com enfeites, muito menos festas regadas à banquetes dignos do imperador romano, com faziam em anos anteriores.

Enquanto isso, na parte baixa da cidade, onde moravam ostrabalhadores volantes - boias-frias, as ruas sem asfalto, cheias buracos causados pela enxurrada das chuvas de verão eram só alegria - crianças brincavam na chuva fina, outros escorregavam na grama molhada, tudo era alegria. Os mais velhos enchiam os botecos e as pequenas vendas que marcavam as compras de mercadorias a granel pesadas na balança em cima do balcão, estavam cheias.....A pinga rolava à solta...

Tudo respirava animação, festejos , felicidade, só não em uma família, a de Bia, Beatriz da Silva, a noiva abandonada no altar e que quase morreu de depressão - a pobrezinha ficou doente por muito tempo, não queria se alimentar....só chorava....

Seus pais e irmãos ajudaram no que podiam, o padre também, até benzedeiras.....

Embora ela continue triste, nos últimos tempos tem demonstrado quere tocar a vida prá frente - conversou com o padre pedindo uma força para que a indicasse um convento - uma congregação que acitasse moças da idade dela: mais de 20 anos. 

O padre aconselhou Bia a passar uns tempos em um mosteiro como uma voluntária da oração....da ajuada com a preparação das refeições......na limpeza, nos cuidados com a horta e com o jardim.

E assim o padre ....enviou a moçacom carta de recomendação  para o Convento das Irmãs Damianas que ficava na capital do país.

Era o ano de 1968, ano sombrio com muita perseguição, morte e tortura ...muita violência policial nas ruas, toque de recolher no país inteiro, após as 10h00 da noite, uma série de proibições descabidas, enfim, a regime ditatorial havia chegado a seu ápice. Todos os estudantes, todos os jovens, todas as pessoas que fossem contra o regime eram taxadas de inimigos da nação, comunista e por isto eram torturados, ameaçados, mortos. Muitos artistas, intelectuais, ativistas de causas sociais como a reforma agrária, o combate a fome e a miséria que só aumentava, ah...estas pessoas eram as comunistas.....assim justificavam os castigos , a violência , a morte....

O desaparecimento de pessoas continuava....o exílio também. Porém havia muita resistência por parte de um grupo de estudantes mais ousados que não temiam dar a própria vida para a libertação do país daquele terrível regime...Muitos jornalistas, professores, músicos foram assassinados por lutarem a fovos dos mais pobres , as principais vítimas do regime....

As poucas Tvs, que tinham na cidade, nem mesmo as novelas eram poupadas da censura, os jornais só mostravam o que os ditadores autorizavam. O rádio também. O programa A vóz do País era sempre às 19h00 e só apresentava notícias de interesse do regime.

Nas ruas, bares, praças, ninguém falava  mal do reguime ou comentava  sobre os desaparecimentos, sobre a vilência da polícia, sobre as prisões arbitrárias. Estava proibido fazer rodinhas de conversa....e havia infiltrados do regime por todos os lados...Nas escolas, onde os jovens acreditavam que tinham mais liberdade para conversar sobre aquela conjuntura política, também haviam infiltrados. Pasmem! _ Até os sermões dos padres nas igrejas eram censurados , a Igreja tinha que ser submissa ao regime e ai daqueles padres que comentassem qualquer crime ou ataque por parte dos jgunços do general.

O tempo foi passando, o regime cada vez mais sanguinário e o povo cada vez mais empobrecido. Os banqueiros e donos de multinacionais ficavam cada vez mais ricos e o pais ia se endividando.

 

Na cidade de Vulcânia, por ser pequena e distante dos grandes centros , nem tudo afetava. Apenas a carestia e a exploração do trabaho dos boias-frias eram sentidos... Uma família toda, colhia café durante um dia e o que ganhavam, mal dava para comprar o mínimo para comer...

Neste contexto de autoritarismo e ausencia do Estado de Direito, as pessoas viviam amedrontadas e intimidadas na cidade de Vulcânia e em todo o país. O desaparecimento de Ângelo e seu amigo Augusto continuava como um mistério e as pessoas nem podiam comentar sobre o assunto.

A família de Angelo sofria calada e isto levou a mãe do rapaz adoecer dos nervos e o pai , desorientado passou a beber e arranjar encrencas nos botecos. Simone, a jovem irmã de Angelo que mesmo fragilizada e sofrendo cuidava da mãe , já que do pai perdera o controle. A fazenda Água grande continuava produzindo muito café e algodão, gerando lucros cada vez mais altos, graças à honestidade e dedicação do capataz.......

Já a fazenda .......da família de Augusto, após seu desaparecimento, passou a acumular prejuízos. O gado, por falta de cuidado passou a adoecer com a febre aftosa, a produção de leite e seus derivados despencou e as dívidas no banco só aumentavam. Já na década de 1970, um dos generais que comandavam o regime, implantou um programa de subsídios `agricultura que tinha como lema: " Plante que o governo garante" O pai de Augusto, assim como diversos fazendeiros da região se empolgaram e fizeram financiamentos para investir na produção de suas terras, na tentativa de salvar suas fazendas da falência, mas na mudança de governo, tudo veio a desmoronar. As dívidas venceram, a colheita rendeu, mas os preços do café e do algodão, assim como do leite e carne bovina, despencaram no mercado exportador e os juros dos financiamentos feitos subiram, levando à falência muitos sitiantes e latifundiários. 

A situação só veio a piorar pois maioria das terras ficaram abandonadas, não havia condições para cultivo da terra e plantio de nova safra e assim muitas famílas tiveram que migrar para as cidades em um momento que os boias-frias também ficaram sem trabalho. 

A fome reinava, crianças morriam de desnutrição, pessoas adoeciam por não se alementarem como deviam , os postos de saúde viviam cheios, mas só atendiam quem tinha a tal carteirnha da previdência social, comprovando que contribuiam mensalmente. Aos pobres e desempregados só restava a caridade das pessoas e das entidades filantrópicas religiosas.

A Irmandade....da qual participava a ....mãe de ângelo, vivia cheia de pessoas pedindo um kg de feijão, um arroz, um leite para as crianças, uma bolacha......mas nem sempre conseguiam, pois após a doença da  fundadora,......as doações cairam muito e a Prefeitura, alegando falta de recursos, deixou de contribuir com a entidade.

A família de Bia, continuava morando na periferia da cidade em rua de cão batido, com esgoto a céu aberto e muita falta de água potável e luz elétrica. 

 A moça que vivia no Convento da Irmãs Damiana, sempre que podia ,vinha visistar a família e trazia algum alimento que sobrava no convento. Bia trabalhava na cozinha onde ajudava a prepara as refeições das freiras e também cuidava da horta e da pequena criação de cabras que forneciam o saboroso leite servido no café da manhã no convento. Como ela tinha onde dormir, comida e roupas, ( uniformes) ela ganhava um salário muito baixo, o que envuava para sua mãe para comprar o mínimo necessário para sua família sobreviver. Um dos irmão de Bia, o Beto, de 14 anos colocou na cabeça que não ia parar os estudos ainda no primário para ajudar na roça, trabalhando de boia fria e assim insistiu em estudar o segundo grau na cidade de candeias , a quase 100 km de distância porque em Vulcânia só tinha escola de primário e isto gerava despesas com uniforme , livros e transporte. Bia ajudava como podia, já que eela mesma nem conseguiu terminar o primário. Precisou para os estudos na sétima série por ter ajudar seus pais a criar os irmão mais novos.

O Natal se aproximavanaqueles anos 70, era das discotecas. A era Disco e as pessoas, ao menos as mais abastadas só pensavam em dançar, dançar e dançar estimulados por uma novela de um importante canal de tv. Era o dance, dance, dance.....A ordem era " Abra as suas asas, solte as suas feras, caia na gandaia, entre nesta festa. Desde que não questinasse o regime , dançar, era permitido. Embalados pela onda das discotecas, a musica do país era deixada em segundo plano, era brega. Chique meso era curtir a música dos imperialistas. Donnna Summer, Bee gees, Olivia Newton John, Roberta Kelly , Tina Charles e bandas com Boney M., santa Esmeralda, entre outras ditavam o que era moda. E neste clima de falsa alegria ,nossa heroina Beatriz, a Bia desembarca na rodoviária da cidade para visitar a sua familia.

A cidade estava cheia de luzes de Natal e a igreja matris toda cheia de lâmpadas coloridas na fachada.

Ouvia-se por todos os lados o Noite Feliz e muitas outras rezas e novenas de Natal. No coreto da pracinha da igreja , algo chamava a atenção: depois de muito tempo o velho ermitão das montanhas deu o sinal de sua graça. O povo se juntava para ouvir suas profecias e devaneios. Bia resolveu parar por lá para também escutar o que o pai da mata tinha a dizer. 

De repente , todos começaram a gritar e correr sem rumo após ouvirem os estampidos de vários tiros em meio as árvores próximas ao coreto.

- Deus me defenda! - Gritou Bia, apavorada.

 

 

 

 

 

 

 

 


O ano de 1967 estava terminando, o clima era de festas de fim de ano. Os enfeites de Natal se viam por todos  os lados. Presépios eram montados na Matriz , nas casa e até em praçãs públicas e jardins das casa.

Na  residência da família de Angelo, apesar do clima de tristeza por conta do desaparecimento do rapaz, a mãe e a iermão montavam um presépio com muitas latinhas de mudinhas de arroz que plantavam com antecedência. A s imagens de Maria, José e dos reis magos, desta vez foram feitas por  João Pretinho , que tinha habilidade em esculturas de argila que retirava do riacho próximo à cidade. 

Ao ajeitar as estatuazinhas na mangedoura, Simone sentiu falta de ovelhinhas, vaquinhas, aves., 

- Mãe, O João pretinho esqueceu das ovelhas e outros bichos que fazem parte do presépio!

- Ah, filha ....coloca os do ano passado.....- Mas mãe! - Aqueles não ornam - são de louça.....- vou agora na casa do Pretinho encomendar os bicchinhos todos de barro...

- E o menino Jesus? - Ficou bem feito? - sim, mãe - ficou bem feito, mas achei ele tristinho.....Maria e José també - estão com carinha de desânimo........

- É, pode ser que quando o João fez, estava pensando no nosso Angelo que só Deus sabe o que aconteceu....- mas tenho fé em Deus - filha.

- Nosso Angelo está vivo. - Coração de mãe não se engana.

Nisso ouviram um barulho de música e percussão vindo da rua. Era uma antiga folia de Reis que todos os anos visitavam as casas das famílias e pediam donativos para fazerem a Grande Festa de Santos Reis que já tinham um local, desta vez. A sede da Fazenda Água Grande à convite do pai de Angelo.

Do outro lado da cidade, já na estrada da Juripoca, o clima na fazenda dos ......, na casa da família de Augusto, tudo era tristeza e saudades...

Dona ........e familia ainda não tinham encontrado ânimo para festejar o Natal, nem com presépio, nem com enfeites, muito menos festas regadas à banquetes dignos do imperador romano, com faziam em anos anteriores.

Enquanto isso, na parte baixa da cidade, onde moravam ostrabalhadores volantes - boias-frias, as ruas sem asfalto, cheias buracos causados pela enxurrada das chuvas de verão eram só alegria - crianças brincavam na chuva fina, outros escorregavam na grama molhada, tudo era alegria. Os mais velhos enchiam os botecos e as pequenas vendas que marcavam as compras de mercadorias a granel pesadas na balança em cima do balcão, estavam cheias.....A pinga rolava à solta...

Tudo respirava animação, festejos , felicidade, só não em uma família, a de Bia, Beatriz da Silva, a noiva abandonada no altar e que quase morreu de depressão - a pobrezinha ficou doente por muito tempo, não queria se alimentar....só chorava....

Seus pais e irmãos ajudaram no que podiam, o padre também, até benzedeiras.....

Embora ela continue triste, nos últimos tempos tem demonstrado quere tocar a vida prá frente - conversou com o padre pedindo uma força para que a indicasse um convento - uma congregação que acitasse moças da idade dela: mais de 20 anos. 

O padre aconselhou Bia a passar uns tempos em um mosteiro como uma voluntária da oração....da ajuada com a preparação das refeições......na limpeza, nos cuidados com a horta e com o jardim.

E assim o padre ....enviou a moçacom carta de recomendação  para o Convento das Irmãs Damianas que ficava na capital do país.

Era o ano de 1968, ano sombrio com muita perseguição, morte e tortura ...muita violência policial nas ruas, toque de recolher no país inteiro, após as 10h00 da noite, uma série de proibições descabidas, enfim, a regime ditatorial havia chegado a seu ápice. Todos os estudantes, todos os jovens, todas as pessoas que fossem contra o regime eram taxadas de inimigos da nação, comunista e por isto eram torturados, ameaçados, mortos. Muitos artistas, intelectuais, ativistas de causas sociais como a reforma agrária, o combate a fome e a miséria que só aumentava, ah...estas pessoas eram as comunistas.....assim justificavam os castigos , a violência , a morte....

O desaparecimento de pessoas continuava....o exílio também. Porém havia muita resistência por parte de um grupo de estudantes mais ousados que não temiam dar a própria vida para a libertação do país daquele terrível regime...Muitos jornalistas, professores, músicos foram assassinados por lutarem a fovos dos mais pobres , as principais vítimas do regime....

As poucas Tvs, que tinham na cidade, nem mesmo as novelas eram poupadas da censura, os jornais só mostravam o que os ditadores autorizavam. O rádio também. O programa A voz do País era sempre às 19h00 e só apresentava notícias de interesse do regime.

Nas ruas, bares, praças, ninguém falava  mal do reguime ou comentava  sobre os desaparecimentos, sobre a vilência da polícia, sobre as prisões arbitrárias. Estava proibido fazer rodinhas de conversa....e havia infiltrados do regime por todos os lados...Nas escolas, onde os jovens acreditavam que tinham mais liberdade para conversar sobre aquela conjuntura política, também haviam infiltrados. Pasmem! _ Até os sermões dos padres nas igrejas eram censurados , a Igreja tinha que ser submissa ao regime e ai daqueles padres que comentassem qualquer crime ou ataque por parte dos jagunços do general.

O tempo foi passando, o regime cada vez mais sanguinário e o povo cada vez mais empobrecido. Os banqueiros e donos de multinacionais ficavam cada vez mais ricos e o pais ia se endividando.

 

Na cidade de Vulcânia, por ser pequena e distante dos grandes centros , nem tudo afetava. Apenas a carestia e a exploração do trabaho dos boias-frias eram sentidos... Uma família toda, colhia café durante um dia e o que ganhavam, mal dava para comprar o mínimo para comer...

Neste contexto de autoritarismo e ausencia do Estado de Direito, as pessoas viviam amedrontadas e intimidadas na cidade de Vulcânia e em todo o país. O desaparecimento de Ângelo e seu amigo Augusto continuava como um mistério e as pessoas nem podiam comentar sobre o assunto.

A família de Angelo sofria calada e isto levou a mãe do rapaz adoecer dos nervos e o pai , desorientado passou a beber e arranjar encrencas nos botecos. Simone, a jovem irmã de Angelo que mesmo fragilizada e sofrendo cuidava da mãe , já que do pai perdera o controle. A fazenda Água grande continuava produzindo muito café e algodão, gerando lucros cada vez mais altos, graças à honestidade e dedicação do capataz.......

Já a fazenda .......da família de Augusto, após seu desaparecimento, passou a acumular prejuízos. O gado, por falta de cuidado passou a adoecer com a febre aftosa, a produção de leite e seus derivados despencou e as dívidas no banco só aumentavam. Já na década de 1970, um dos generais que comandavam o regime, implantou um programa de subsídios `agriculyuta que tinha como lema: " Plante que o governo garante" O pai de Augusto, assim como diversos fazendeiros da região se empolgaram e fizeram financiamentos para investir na produção de suas terras, na tentativa de salvar suas fazendas da falência, mas na mudança de governo, tudo veio a desmoronar. As dívidas venceram, a colheita rendeu, mas os preços do café e do algodão, assim como do leite e carne bovina, despencaram no mercado exportador e os juros dos financiamentos feitos subiram, levando à falência muitos sitiantes e latifundiários. 

A situação só veio a piorar pois maioria das terras ficaram abandonadas, não havia condições para cultivo da terra e plantio de nova safra e assim muitas famílas tiveram que migrar para as cidades em um momento que os boias-frias também ficaram sem trabalho. 

A fome reinava, crianças morriam de desnutrição, pessoas adoeciam por não se alementarem como deviam , os postos de saúde viviam cheios, mas só atendiam quem tinha a tal carteirnha da previdência social, comprovando que contribuiam mensalmente. Aos pobres e desempregados só restava a caridade das pessoas e das entidades filantrópicas religiosas.

A Irmandade....da qual participava a ....mãe de ângelo, vivia cheia de pessoas pedindo um kg de feijão, um arroz, um leite para as crianças, uma bolacha......mas nem sempre conseguiam, pois após a doença da  fundadora,......as doações cairam muito e a Prefeitura, alegando falta de recursos, deixou de contribuir com a entidade.

A família de Bia, continuava morando na periferia da cidade em rua de cão batido, com esgoto a céu aberto e muita falta de água potável e luz elétrica. 

 A moça que vivia no Convento da Irmãs Damiana, sempre que podia ,vinha visistar a família e trazia algum alimento que sobrava no convento. Bia trabalhava na cozinha onde ajudava a prepara as refeições das freiras e também cuidava da horta e da pequena criação de cabras que forneciam o saboroso leite servido no café da manhã no convento. Como ela tinha onde dormir, comida e roupas, ( uniformes) ela ganhava um salário muito baixo, o que envuava para sua mãe para comprar o mínimo necessário para sua família sobreviver. Um dos irmão de Bia, o Beto, de 14 anos colocou na cabeça que não ia parar os estudos ainda no primário para ajudar na roça, trabalhando de boia fria e assim insistiu em estudar o segundo grau na cidade de candeias , a quase 100 km de distância porque em Vulcânia só tinha escola de primário e isto gerava despesas com uniforme , livros e transporte. Bia ajudava como podia, já que eela mesma nem conseguiu terminar o primário. Precisou para os estudos na sétima série por ter ajudar seus pais a criar os irmão mais novos.

O Natal se aproximavanaqueles anos 70, era das discotecas. A era Disco e as pessoas, ao menos as mais abastadas só pensavam em dançar, dançar e dançar estimulados por uma novela de um importante canal de tv. Era o dance, dance, dance.....A ordem era " Abra as suas asas, solte as suas feras, caia na gandaia, entre nesta festa. Desde que não questinasse o regime , dançar, era permitido. Embalados pela onda das discotecas, a musica do país era deixada em segundo plano, era brega. Chique meso era curtir a música dos imperialistas. Donnna Summer, Bee gees, Olivia Newton John, Roberta Kelly , Tina Charles e bandas com Boney M., santa Esmeralda, entre outras ditavam o que era moda. E neste clima de falsa alegria ,nossa heroina Beatriz, a Bia desembarca na rodoviária da cidade para visitar a sua familia.

A cidade estava cheia de luzes de Natal e a igreja matris toda cheia de lâmpadas coloridas na fachada.

Ouvia-se por todos os lados o Noite Feliz e muitas outras rezas e novenas de Natal. No coreto da pracinha da igreja , algo chamava a atenção: depois de muito tempo o velho ermitão das montanhas deu o sinal de sua graça. O povo se juntava para ouvir suas profecias e devaneios. Bia resolveu parar por lá para também escutar o que o pai da mata tinha a dizer. 

De repente , todos começaram a gritar e correr sem rumo após ouvirem os estampidos de vários tiros em meio as árvores próximas ao coreto.

- Deus me defenda! - Gritou Bia, apavorada.

 

 

 

 

 

 

 

 

O ano de 1967 estava terminando, o clima era de festas de fim de ano. Os enfeites de Natal se viam por todos os lados. Presépios eram montados na Matriz na casa e até em praças públicas e jardins da casa.

Na residência da família de Ângelo, apesar do clima de tristeza por conta do desaparecimento do rapaz, a mãe e a irmã montavam um presépio com muitas latinhas de mudinhas de arroz que plantavam com antecedência. As imagens de Maria, José e dos reis magos, desta vez foram feitas por João Pretinho que tinha habilidade em esculturas de argila que retirava do riacho próximo à cidade.

Ao ajeitar as estatuazinhas na manjedoura, Simone sentiu falta de ovelhinhas, vaquinhas, aves.,

- Mãe, O João pretinho esqueceu das ovelhas e outros bichos que fazem parte do presépio!

- Ah, filha - coloca os do ano passado - Mas mãe! - Aqueles não ornam - são de louça - vou agora na casa do Pretinho encomendar os bichinhos todos de barro...

- E o menino Jesus? - Ficou bem feito? - sim, mãe - ficou bem feito, mas achei ele tristinho. Maria e José também - estão com carinha de desânimo.

- É, pode ser que quando o João fez, estava pensando no nosso Ângelo que só Deus sabe o que aconteceu, mas tenho fé em Deus - filha.

- Nosso Ângelo está vivo. - Coração de mãe não se engana.

Nisso ouviram um barulho de música e percussão vindo da rua. Era uma antiga folia de Reis que todos os anos visitavam as casas das famílias e pediam donativos para fazerem a Grande Festa de Santos Reis que já tinham um local, desta vez. A sede da Fazenda Água Grande a convite do pai de Ângelo.

Do outro lado da cidade, já na estrada da Jiripoca, o clima na fazenda dos ......, na casa da família de Augusto, tudo era tristeza e saudades...

Dona ........e família ainda não tinham encontrado ânimo para festejar o Natal, nem com presépio, nem com enfeites, muito menos festas regadas à banquetes dignos do imperador romano, com faziam em anos anteriores.

Enquanto isso, na parte baixa da cidade, onde moravam os trabalhadores volantes - boias-frias, as ruas sem asfalto, cheias buracos causados pela enxurrada das chuvas de verão eram só alegria - crianças brincavam na chuva fina, outros escorregavam na grama molhada, tudo era alegria. Os mais velhos enchiam os botecos e as pequenas vendas que marcavam as compras de mercadorias a granel pesadas na balança em cima do balcão, estavam cheias.

A pinga rolava à solta...

Tudo respirava animação, festejos, felicidade, só não em uma família, a de Bia, Beatriz da Silva, a noiva abandonada no altar e que quase morreu de depressão - a pobrezinha ficou doente por muito tempo, não queria se alimentar - só chorava.

Seus pais e irmãos ajudaram no que podiam, o padre também, até benzedeiras.

Embora ela continue triste, nos últimos tempos tem demonstrado quere tocar a vida pra frente - conversou com o padre pedindo uma força para que a indicasse um convento - uma congregação que aceitasse moças da idade dela: mais de 20 anos.

O padre aconselhou Bia a passar uns tempos em um mosteiro como uma voluntária da oração ajudada com a preparação das refeições......na limpeza, nos cuidados com a horta e com o jardim.

E assim o padre enviou a moça com carta de recomendação para o Convento das Irmãs Damianas que ficava na capital do país.

Era o ano de 1968, ano sombrio com muita perseguição, morte e tortura ...muita violência policial nas ruas, toque de recolher no país inteiro, após as 10h00 da noite, uma série de proibições descabidas, enfim, a regime ditatorial havia chegado a seu ápice. Todos os estudantes, todos os jovens, todas as pessoas que fossem contra o regime eram taxadas de inimigos da nação, comunista e por isto eram torturados, ameaçados, mortos.

 Muitos artistas, intelectuais, ativistas de causas sociais como a reforma agrária, o combate à fome e a miséria que só aumentava, ah...estas pessoas eram as comunistas - assim justificavam os castigos, a violência, a tortura, a morte....

O desaparecimento de pessoas continuava o exílio também. Porém havia muita resistência por parte de um grupo de estudantes mais ousados que não temiam dar a própria vida para a libertação do país daquele terrível regime. Muitos jornalistas, professores, músicos foram assassinados por lutarem a favor dos mais pobres, contra a exploração e especulação da terra, enfim, como sempre eram as principais vítimas do regime.

As poucas Tvs, que tinham na cidade, nem mesmo as novelas eram poupadas da censura, os jornais só mostravam o que os ditadores autorizavam. O rádio também. O programa A voz do País era sempre às 19h00 e só apresentava notícias de interesse do regime.

Nas ruas, bares, praças, ninguém falava mal do regime ou comentava sobre os desaparecimentos, sobre a violência da polícia, sobre as prisões arbitrárias. Estava proibido fazer rodinhas de conversa – haviam infiltrados do regime por todos os lados.

Nas escolas, onde os jovens acreditavam que tinham mais liberdade para conversar sobre aquela conjuntura política, também haviam infiltrados. Pasmem!  Até os sermões dos padres nas igrejas eram censurados, a Igreja tinha que ser submissa ao regime e ai daqueles padres que comentassem qualquer crime ou ataque por parte dos jagunços do general.

O tempo foi passando, o regime cada vez mais sanguinário e o povo cada vez mais empobrecido. Os banqueiros e donos de multinacionais ficavam cada vez mais ricos e o país ia se endividando.

 

 

Na cidade de Vulcânica, por ser pequena e distante dos grandes centros, nem tudo afetava. Apenas a carestia e a exploração do trabalho dos boias-frias eram sentidas... Uma família toda, colhia café durante um dia e o que ganhavam, mal dava para comprar o mínimo para comer...

Neste contexto de autoritarismo e ausência do Estado de Direito, as pessoas viviam amedrontadas e intimidadas na cidade de Vulcânica e em todo o país. O desaparecimento de Ângelo e seu amigo Augusto continuava como um mistério e as pessoas nem podiam comentar sobre o assunto.

A família de Ângelo sofria calada e isto levou a mãe do rapaz adoecer dos nervos e o pai, desorientado passou a beber e arranjar encrencas nos botecos. Simone, a jovem irmã de Ângelo que mesmo fragilizada e sofrendo cuidava da mãe, já que do pai perdera o controle. A fazenda Água grande continuava produzindo muito café e algodão, gerando lucros cada vez mais altos, graças à honestidade e dedicação do capataz.......

Já a fazenda .......da família de Augusto, após seu desaparecimento, passou a acumular prejuízos. O gado, por falta de cuidado passou a adoecer com a febre aftosa, a produção de leite e seus derivados despencou e as dívidas no banco só aumentavam. Já na década de 1970, um dos generais que comandavam o regime, implantou um programa de subsídios `agricultura que tinha como lema: " Plante que o governo garante" O pai de Augusto, assim como diversos fazendeiros da região se empolgaram e fizeram financiamentos para investir na produção de suas terras, na tentativa de salvar suas fazendas da falência, mas na mudança de governo, tudo veio a desmoronar. As dívidas venceram, a colheita rendeu, mas os preços do café e do algodão, assim como do leite e carne bovina, despencaram no mercado exportador e os juros dos financiamentos feitos subiram, levando à falência muitos sitiantes e latifundiários.

A situação só veio a piorar pois maioria das terras ficaram abandonadas, não havia condições para cultivo da terra e plantio de nova safra e assim muitas famílias tiveram que migrar para as cidades em um momento que os boias-frias também ficaram sem trabalho.

A fome reinava, crianças morriam de desnutrição, pessoas adoeciam por não se alimentarem como deviam, os postos de saúde viviam cheios, mas só atendiam quem tinha a tal carteirinha da previdência social, comprovando que contribuíam mensalmente. Aos pobres e desempregados só restava a caridade das pessoas e das entidades filantrópicas religiosas.

A Irmandade da qual participava a mãe de Ângelo, vivia cheia de pessoas pedindo um kg de feijão, um arroz, um leite para as crianças, uma bolacha, mas nem sempre conseguiam, pois após a doença da fundadora, as doações caíram muito e a Prefeitura, alegando falta de recursos, deixou de contribuir com a entidade.

A família de Bia, continuava morando na periferia da cidade em rua de cão batido, com esgoto a céu aberto e muita falta de água potável e luz elétrica.

 A moça que vivia no Convento da Irmãs Damiana, sempre que podia, vinha visitar a família e trazia algum alimento que sobrava no convento. Bia trabalhava na cozinha onde ajudava a preparar as refeições das freiras e cuidava da horta e da pequena criação de cabras que forneciam o saboroso leite servido no café da manhã no convento. Como ela tinha onde dormir, comida e roupas, (uniformes) ela ganhava um salário muito baixo, o que enviava para sua mãe para comprar o mínimo necessário para sua família sobreviver. Um dos irmãos de Bia, o Beto, de 14 anos colocou na cabeça que não ia parar os estudos ainda no primário para ajudar na roça, trabalhando de boia fria e assim insistiu em estudar o segundo grau na cidade de candeias, a quase 100 km de distância porque em Vulcânica só tinha escola de primário e isto gerava despesas com uniforme, livros e transporte. Bia ajudava como podia, já que ela mesma nem conseguiu terminar o primário. Precisou para os estudos na sétima série por ter de ajudar seus pais a criar os irmãos mais novos.

O Natal se aproximava naqueles anos 70, era das discotecas. A era Disco e as pessoas, ao menos as mais abastadas só pensavam em dançar, dançar e dançar estimulados por uma novela de um importante canal de tv. Era o dance, dance, dance.

A ordem era " Abra as suas asas, solte as suas feras, caia na gandaia, entre nesta festa. Desde que não questionasse o regime, dançar, era permitido. Embalados pela onda das discotecas, a música do país era deixada em segundo plano, era brega. Chique mesmo era apreciar a música dos imperialistas. Donna Summer, Bee Gees, Olivia Newton John, Roberta Kelly, Tina Charles e bandas com Boney M., santa Esmeralda, entre outras ditaram o que era moda. E neste clima de falsa alegria, nossa heroína Beatriz, a Bia desembarca na rodoviária da cidade para visitar a sua família.

A cidade estava cheia de luzes de Natal e a igreja matriz toda cheia de lâmpadas coloridas na fachada.

Ouvia-se por todos os lados o Noite Feliz e muitas outras rezas e novenas de Natal. No coreto da pracinha da igreja, algo chamava a atenção: depois de muito tempo o velho ermitão das montanhas deu o sinal de sua graça. O povo se juntava para ouvir suas profecias e devaneios. Bia resolveu parar por lá para também escutar o que o pai da mata tinha a dizer.

De repente,  todos começaram a gritar e correr sem rumo após ouvirem os estampidos de vários tiros em meio as árvores próximas ao coreto.

- Deus me defenda! - Gritou Bia, apavorada.


Comentários

Anônimo disse…
Estamos ansiosos aguardando o lançamento deste livro que já é sucesso neste blog.

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